segunda-feira, 24 de setembro de 2012

PE. CORREIA DA CUNHA – 95º ANIVERSÁRIO

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PE. JOSÉ CORREIA DA CUNHA
Mestre de Vida


24 SET.1917 – 24 SET.2012

 

 

 

No dia em que passam noventa e cinco anos sobre o seu nascimento (24 de Setembro 1917), temos a necessidade de elevar o nosso pensamento, para recordar aquele que não arredou um só passo do caminho pelo respeito humano ou por motivos da insana reprovação que as nobres atitudes, por mal entendidas, tantas vezes despertam.

 

Nunca rastejou perante os seus pares e superiores, pois perante Deus não há distinção de pessoas; Ele trata todos de igual modo. Todos somos filhos do mesmo Pai. O Padre Correia da Cunha não se humilhava nem se orgulhava da sua verticalidade.

 

 

 

A sua vida foi espelho de um ideal que trabalhou com total dedicação e amor, tentando aprimorar permanentemente as suas muitas imperfeições e reconhecendo-se publicamente como o maior pecador de todos homens.

 

Homem com formação cimentada no Seminário e aperfeiçoada na Armada parecia à primeira vista incapaz de articular a cólera perante aqueles que procuravam que ele se inclinasse. Sempre lhe ouvi afirmar com toda a convicção: “ vassalagem só a Deus”. Era delicioso ouvi-lo em momentos em que a razão e a justiça o tornavam eloquente para as grandes discussões e decisões que tinha de enfrentar e tomar, por mais arrojadas que elas fossem.




 
 
Em contrapartida era de uma compreensão inexcedível para com os humildes. O Padre Correia da Cunha possuía uma arte subtil para escutar, o que lhe possibilitava descobrir as grandes mágoas, que que por vezes a rudeza destes seus irmãos mal sabia expressar. Muitas vezes senti que ficava com o coração rasgado e que apenas a inspiração nas palavras com raiz no Evangelho eram insuficientes para sarar tais sofrimentos. Para ele era hora de expressar em acção os princípios em que confiava e a sua profunda crença na providência Divina. Se necessário dava tudo o que possuía!

 

Nunca ninguém o viu recusar um abraço de amizade e de admiração aos muitos jovens que o rodeavam. O Padre Correia da Cunha tudo fazia para os ajudar a crescer como homens e cidadãos honrados na construção de uma sociedade justa e fraterna. Este trabalho desenvolvia-o com a certeza de que cumpria um dever grato ao seu coração.






As suas ideias primavam pelo calor que as aquecia. O erro não o apanhava desprevenido. Quando na sua presença os “bardamerdas” da blasfémia, como ele referia, convidavam Deus a desaparecer da nossa história… num sorrio sarcástico afirmava com toda a sua clarividência: “Se Deus nos abandonasse, o Mundo seria uma selvageria cruel e os monstros tripudiariam!...” 

 

 

O Padre Correia da Cunha era um homem de profunda e ampla sensibilidade capaz de traduzir, no seu convívio com os irmãos, os mais íntimos acordes do coração e os mais dedicados frémitos da vida. Foi padre mas foi sobretudo um irmão, que nos legou uma grande lição que continua a ser oportuna, cheia de beleza e sentido: Amar a Deus e o próximo e sermos fiéis ao nosso nobre povo português, que é notável e de uma grandeza magnífica fé em Cristo!

 

Recordar o Padre Correia da Cunha é elevar o espírito e os corações. É um dever homenagear aquele que se empenhou na orientação de muitas gerações de jovens nos caminhos do Evangelho e ainda hoje é um farol que continua a projectar raios através dos seus exemplos de coragem e vida.

 

 

Renovo hoje aqui aquele afectuoso pedido, a todos os que directamente o conheceram e com ele conviveram, assim como aqueles que o descobrem neste blogue: uma homenagem - In Memoriam de Padre José Correia da Cunha. Um singelo louvor a relembrá-lo numa simples página A4 com assinatura que permita a sua correcta digitalização.

 

 

 

Um simples texto pode descobrir todo o sentido, exprimindo o homem que queremos projectar pela sua vasta inteligência e cultura, numa confundível e imortal presença.

 

Nessas curtas linhas, lembro que deveremos apenas recordá-lo como um inesquecível amigo. Um homem simples que nos habituamos a ver na sua modéstia e enorme simpatia. Evocá-lo com respeito e veneração pois a sua figura ímpar de intelectual sempre o mereceu, tal como o seu espírito aberto, que era sensível a todas as manifestações inovadoras do seu tempo.
 
 
 
 
 
 
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quinta-feira, 13 de setembro de 2012

PE. CORREIA DA CUNHA E O MOSTEIRO S. VICENTE DE FORA


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PE CORREIA DA CUNHA E CORVO VICENTE



Naqueles espaços delicados e abertos conseguia ingressar nos mais profundos sentimentos e reflexões… E assim o fez ao longo da vida para chegar a Deus e aos irmãos!






É impossível pensar sobre o Mosteiro de São Vicente de Fora sem reflectir sobre o Padre Correia da Cunha. A chegada, nos anos quarenta, deste jovem padre de cultura e amante das artes, ao abandonado mosteiro dos frades regrantes de Santo Agostinho apresentou-se como uma indelével e eterna paixão. A arte expressa nos seus belos azulejos era uma bênção para ele que duraria até ao dia do seu último suspiro. Estes encantadores espaços do Mosteiro de São Vicente de Fora foram a sua vida.

O primeiro espaço, do descomunal mosteiro, ocupado pelo então jovem capelão da Armada Portuguesa foi um quarto contíguo à nobre Sala da Portaria cedido pelo velhinho pároco, Mons. Francisco Esteves (1871/1959). VER FOTO.





Foi neste pequeno espaço que vivera os seus primeiros sonhos e emoções que ficariam inscritos nas pedras e nos painéis de azulejos. Foi da intimidade deste seu quarto que partiria para a descoberta de todos aqueles amplos e esplendorosos espaços que albergavam ainda algumas repartições administrativas do Estado assim como longos corredores e salas deixados vazios pelo Liceu Central de Gil Vicente, que foi ali criado em 1914*.

* A actual Escola Secundária de Gil Vicente, anterior Liceu Nacional de Gil Vicente, nasce como uma secção oriental do Liceu Passos Manuel, tornando-se autónomo em 1915, sendo o primeiro liceu de Lisboa criado após a República. O mesmo funcionou no Mosteiro de São Vicente de Fora até 1949, ano em que, na antiga cerca deste mosteiro foram inauguradas as actuais instalações.



Com a nomeação do Padre Correia da Cunha, no ano de 1960, para pároco de São Vicente de Fora, este decidiu instalar a sua residência paroquial nos amplos espaços dos claustros, ocupando um salão que transformou em quarto e duas amplas salas para área de trabalho e para construir momentos de relação com os seus paroquianos.


Das muitas janelas que dispunham as salas da residência paroquial, podia apenas observar as muitas miseráveis barracas existentes no enorme pátio anexo ao Mosteiro.

Foi por pressão sua que a Fundação Cardeal Cerejeira, criada no ano de 1957, por ocasião do jubileu académico do Dr. Manuel Gonçalves Cerejeira, veria a solucionar este degradante cenário com a construção de casas para essas famílias carenciadas no bairro de Santa Maria dos Olivais.


O Padre Correia da Cunha era uma pessoa de riscos e jamais desistiria de nortear a sua vida pelos valores e princípios em que confiava.

Rigoroso e ético mantinha-se fiel à sua filosofia de vida: aquele degradante e miserável cenário não o deixava dormir tranquilamente, pelo que permanentemente fazia eco desta sua amargura junto do Cardeal Cerejeira, que o adorava e tinha uma imensa afeição paternal pelo jovem padre. Um dia teve conhecimento que o Cardeal Patriarca de Lisboa se engajou e se comprometeu na resolução desta questão de elementar justiça, transformando o Evangelho em acção.




Com a saída do antigo sacristão, Sr. Manuel, o Padre Correia da Cunha se instalou no primeiro piso do Mosteiro, no espaço ocupado por este colaborador desde os tempos do seu antecessor. Estes aposentos eram finalmente sentidos como o seu abrigo de descanso e permitiam ao Padre Correia da Cunha gozar da possibilidade de avistar toda a bela paisagem sobre a colina do Castelo de São Jorge.





Só mais tarde, com a colaboração das OGFE, projectou e construiu a sua residência no topo do edifício, onde podia cultivar o seu espírito, com esplêndidas vistas sobre todo o Estuário do Tejo e as colinas da sua amada Lisboa.





Segundo as palavras dos seus médicos, o Padre Correia da Cunha precisava de sol, de forma a suavizar o sofrimento da sua dolorosa doença reumática. Naquele imenso terraço orientado para o pôr-do-sol, onde dispunha de espreguiçadeiras para os seus banhos de sol, lembro-me de indescritíveis experiências e momentos de prazer, paz e liberdade, tomando umas cervejas fresquinhas, entre amigos, e olhando aqueles cenários deslumbrantes.





Será difícil não recordar esses momentos de convívio com um homem de grande envergadura, que não se compadecia com meias tintas. Afirmava tudo o que pensava com admirável precisão. Por isso hoje é amado mas também odiado por aqueles cujo os vícios são opostos a tais virtudes. Uma coisa, asseguro: a sua linguagem era simples, clara, objectiva e sucinta, à boa maneira maruja.




Esta última residência do Padre Correia da Cunha era por ele descrita como a proa de um enorme navio, onde a sua alma suspensa podia alcançar todo o convés assim como um infindável horizonte para além Tejo. Era um precioso lugar para viver, trabalhar em paz e onde a alegria e a felicidade da companhia das imensas obras de arte que coleccionou ao longo da vida, lhe enchiam o coração e o espírito. Mas havia naquele lugar um espaço especial e desejável. Uma enorme mesa de trabalho com um porta-retratos daquelas que amava e eram os verdadeiros encantos da sua vida…e todas as manhãs o cheiro do Alentejo chegava a Lisboa...





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segunda-feira, 3 de setembro de 2012

PE. CORREIA DA CUNHA E O POETA

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“ Ó ondas do mar salgado. Donde vos vem tanto sal? Vem das lágrimas choradas. Nas praias de Portugal!”

 
 
 
 

Todo o homem de elevada cultura possui uma ideia fundadora que orienta a sua vida. Para o Padre Correia da Cunha era bem clara a sua matriz cristã. Houve contudo, um eminente poeta que desde muito jovem lhe encantou o coração: António Correia de Oliveira (1878-1960). As suas sublimes poesias eram para o jovem seminarista uma pausa de silêncio, de ternura e de meditação.
 
A luz que irradiava da sua escrita era simples, modesta e doce, mas que iluminava de uma maneira misteriosa toda a Terra. O Padre Correia da Cunha, à semelhança de António Correia de Oliveira, era dotado de um especial jeito para descobrir e cantar a graça das coisas simples.

 
 

 
Se o homem é produto do meio em que vive e se forma, não admira que a fotografia de António Correia de Oliveira o tenha sempre acompanhado e ocupasse um lugar de destaque na sua secretária no seminário dos Olivais.
 
Foi também nessa casa, onde teve os maiores professores em todas as boas letras e os melhores mestres em erudição. O jovem seminarista Correia da Cunha enriquecia-se com a leitura das obras de António Correia de Oliveira que eram autênticos tesouros para a limpidez da sua inspiração, a frescura do seu lirismo e o vigor do seu patriotismo nas raízes, que o ligaram às suas fortes crenças na religiosidade da sua alma, no amor da Pátria e na glorificação de Deus.
 
Quando hoje todos parecem apostados em pensar apenas nos valores materiais, é consolador recordar estes dois homens que valorizaram pelo exemplo das suas vidas virtuosas, a beleza, a verdade, o heroísmo e a justiça. Não é pois de espantar que as suas linguagens fossem tão naturais e que espontaneamente traduzissem a elevação do pensamento, o esplendor da imaginação e a profunda delicadeza da alma.
 
 
Estou profundamente convicto que estes homens eram tocados pelo mistério do Espírito Santo, pois para eles não havia coisas grandes ou pequenas: umas e outras valiam pelo sopro de inspiração que as penetrava. As suas lutas neste mundo de passagem, consistiram em descobrir os caminhos misteriosos que conduzem ao âmago de cada ser humano.
 
Creio que eram missões predestinadas por Deus ao poeta, através das suas actividades mais intelectuais e estéticas, e ao sacerdote, nas suas acções mais morais e religiosas. No entanto, ambos tinham bem apurado o sentido de amor a Deus, à Família e à Pátria.
 
Pelos testemunhos do Padre Correia da Cunha aprendi que Portugal era uma realidade viva, com língua, costumes e tradições seculares … um património brilhante que herdámos e que tínhamos o dever de transmitir mais enriquecido às novas gerações. E se o sentimento, mais ainda que a inteligência é a luz da humanidade, cada um de nós é zelador da imensa chama da alma portuguesa e que o heróico passado é digno de memória.
 
Todos os que tivemos o privilégio de conviver com o Padre Correia da Cunha constatámos que o que ele mais valorizava era a singeleza, a espontaneidade profunda e a maneira de ser somente ele próprio.
 
O Padre Correia da Cunha também pelos seus particulares dons era brilhante na oratória, pela facilidade com que expunha uma nova ideia ou conceito numa linguagem de rara beleza e de uma prodigiosa clareza e impressionante imaginação.
 
Termino com este lindíssimo poema de António Correia de Oliveira, onde manifesta todo o seu extraordinário talento.

 
 
 
 

O que sou eu? – O Perfume,
Dizem os homens. – Serei.
Mas o que sou nem eu sei…
Sou uma sombra de lume!



Rasgo a aragem como um gume
De espada: Subi. Voei.
Onde passava, deixei
A essência que me resume.



Liberdade, eu me cativo:
Numa renda, um nada, eu vivo
Vida de Sonho e Verdade!

 
 
 
Passam os dias, e em vão!
– Eu sou a Recordação;
Sou mais, ainda: a Saudade.

 
 
Ambos serviram o seu amado Portugal nas causas que se dedicaram com toda a alma, entusiasmo e perseverança, o ardor e empenho com que só os homens de imensa fé sabem servir, um feito poeta e outro homem de Igreja … E os factos mostram que esse serviço foi magnífico, pois engrandeceram e valorizaram muitas gerações na busca ao infinito da graça de DEUS.

 
 



A observação da foto do poeta na sua estante e recuperada no seu espólio fotográfico, que hoje publico, levaram-me a escrever este post. Só a admiração e veneração que Correia da Cunha consagrava a este génio das letras poderiam manter estes documentos imortalizados. Creio serem sinais do tributo de agradecimento que atribuiu aquele que seguramente foi fonte da sua inesgotável inspiração. Mas mantenho uma interrogação por desvendar: haveria outros laços que uniam estes homens com um natural afecto, o de darem a Portugal e à Igreja um esplendor de verdade, justiça e liberdade?
 
 
 
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