segunda-feira, 20 de maio de 2013

PE. CORREIA DA CUNHA E A CRUZADA EUCARISTICA











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“ SOMOS PEQUENOS DA CRUZADA. TEMPO ESPERANÇA DO SENHOR. SOMOS NÓS A GERAÇÃO FORMADA NA ESCOLA DO NOSSO DEUS DE AMOR.”



Nesta singela homenagem ao Padre Correia da Cunha, reside uma permanente preocupação, descrever os caminhos de muitas gerações que viveram umbilicalmente vinculadas a este pároco, que se entregou de alma e coração à comunidade paroquial de São Vicente de Fora (1960-1977).


Chamo a atenção das pessoas do meu tempo para os imensos tesouros de conhecimento, valores humanos e cristãos que estiveram na génese da nossa cultura e que não deveremos ter vergonha de os levantar como a nossa grandiosa bandeira. À semelhança do Padre Correia da Cunha, deveremos continuar a missão de incentivar as actuais novas gerações a cultivarem o amor a Jesus Cristo e ao próximo.


Nada melhor para conhecer a vida de uma comunidade cristã do que falar dos movimentos e obras a que estivemos enraizados no nosso percurso de vida. Hoje, quero aqui recordar a Cruzada Eucarística.


A Cruzada Eucarística das crianças foi instituída na Paróquia de São Vicente de Fora, nos anos 30, pelo Monsenhor Francisco Esteves (1871-1959) que muito se esmerava na instrução religiosa das crianças da paróquia. O velhinho prior tinha uma grande clareza sobre os efeitos salutares desta obra do Apostolado da Oração: comunhão, reparação (sacrifício) e apostolado.




Contrariamente aos rumores que se espalharam aos quatro ventos na Paróquia, o Padre Correia da Cunha prometeu a si próprio honrar e respeitar as pias obras existentes na Paróquia de São Vicente de Fora e sempre manifestou a sua total disposição para engrandecer essa salutar herança. Um caso concreto é esta obra juvenil.


A Cruzada Eucarística a que pertenci nos inícios dos anos sessenta era uma irmandade destinada a crianças e adolescentes. Esta obra tinha uma espiritualidade própria e, nas reuniões semanais, todos aprofundávamos os conhecimentos espirituais e da doutrina cristã.


Os membros da Cruzada Eucarística participavam activamente uniformizados nas Eucaristia e procissões, cantando com muito fervor o seu belo hino. Notabilizados, os rapazes exibiam a sua faixas brancas com a Cruz de Cristo, que era disposta diagonalmente no tórax, partindo do ombro esquerdo e seguindo até ao quadril direito. Por sua vez, as raparigas envergavam uma veste branca curta, aberta dos lados, com a Cruz de Cristo no peito e um pano branco na cabeça preso com uma fita vermelha.


Recordo que nas missas dominicais eram intermináveis as filas da comunhão. Os elementos de cada irmandade paroquial comungavam juntos, cada qual, com os seus distintivos.


Era nas tardes de sábado que se juntava no adro da igreja toda a criançada para brincar. Era depois desse tempo generoso de brincadeira, que o imenso grupo se reunia para nos ser instruída a Doutrina do Amor de Deus. Era cooperadora activa desta obra apostólica, a nossa saudosa Ana Maria Themudo Barata (1922-1982) que acompanhava o Padre Correia da Cunha nessa nobre missão evangelizadora.


Anita, como era vulgarmente conhecida, possuía uma cândida alma. Lembro que era um exemplo vivo para todos nós, dedicando toda a sua vida a um trabalho fecundo de apostolado. O odor das suas virtudes espalhava-se em seu redor. Já padecendo da sua dolorosa doença, não se limitava a dar o exemplo de resignação no sofrimento (sempre alegre…sempre sorridente…), frutificando a todos com o seu exemplo. Era uma verdadeira irmã que amava todos. Creio que ainda hoje continua a ser recordada e estou seguro de que merece este preito de respeito e admiração, por todos os que tiveram o privilégio de com ela conviver.


Todo o ano Litúrgico era intensamente vivido. Em Maio, todas as noites eram preenchidas com a recitação do terço, pelas raparigas da Cruzada, que culminava com a Coração de Nossa Senhora. Em Junho, o mês do Sagrado Coração de Jesus era maravilhoso. Os elementos da Cruzada Eucarística braço infantil do Apostolado da Oração eram os adoradores do Santíssimo Sacramento, pois não podiam estes pequenos “soldados” da Cruzada deixar de prestar todas as honras e louvores ao Seu Rei Todo-Poderoso.
Na época da quaresma, todas as sextas-feiras rezavam solenemente, sob a orientação do Padre Correia da Cunha, a Via-sacra. Os nossos pequenos corações iam aos poucos sendo recolhidos para o grande retiro da Semana Santa.



Quando o Domingo de Ramos chegava era a grande bênção. Um elevado número de membros da Cruzada Eucarística participava no cerimonial processional. Todos éramos incentivados à ascese destes ritos que elevavam o espírito através da magnífica manifestação de fé e oração.


Dava gosto ver a multidão de paroquianos que acompanhava a procissão de Ramos desde o Panteão Nacional até à Igreja Paroquial. Era como se milhares de corações unidos formassem um só.


Todos ali estávamos sintonizados no mesmo espírito do Padre Correia da Cunha: manifestar publicamente a nossa fé e, ao mesmo tempo, recordar as tradições herdadas dos nossos antepassados.


Em meados dos anos sessenta, o bom povo de São Vicente de Fora gozava de grande simplicidade. As pessoas eram naturalmente alegres mas já se faziam sentir os novos ventos pós conciliares e esse movimento com a nova organização sócio-religiosa foram naturalmente substituídos pelos grupos de adolescentes cristãos que, como a Cruzada, continuaram a incentivar os mais novos a darem bons exemplos de vida cristã e a participarem nos Sacramentos da Comunhão com a Igreja e a testemunharem Jesus Cristo em todas as acções do quotidiano.























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segunda-feira, 13 de maio de 2013

PE. CORREIA DA CUNHA E AS PEREGRINAÇÕES












 
“O FIM DA LONGA MARCHA ESTÁ À VISTA…”

 

 

 

As peregrinações ao Santuário de Fátima eram uma das expressões mais belas da devoção do Padre Correia da Cunha, à Virgem Santa, Mãe da Igreja e Mãe da Humanidade. Gostava de fazê-las com pequenos grupos num clima de recolhimento e intimidade.

 

Palmilhou dezenas de quilómetros, arrastando-se pelas longas estradas, curvado pelo peso de uma vida ao serviço dos irmãos. Chegava exausto, recitando litanias repletas de esperança e resignação. Ao longe já avistava numa névoa o Santuário da Virgem de Fátima. A visão sublime seguia à frente, como que a guiar os seus passos.

 

O Padre Correia da Cunha sabia que naquele chão sagrado podiam orar e meditar, mesmo perante a sempre crescente multidão  devota que ininterruptamente acorria àquele santo lugar.

 

Fátima é reconhecida em todo o Mundo pelo espírito de penitência e oração que anima a ingente multidão dos seus peregrinos. O Santuário de Nossa Senhora de Fátima é um poderoso centro de atracção espiritual, como o testemunha o crescido número de casas conventuais de oração que ali se instalaram e continuam  a marcar presença. 



Fátima é uma viva concretização da mensagem evangélica aqui recordada pela Mãe de Deus. Basta pensar nos generosos sacrifícios e ferventes preces que deste recinto sagrado se elevam até Deus, pela conversão dos pecadores e pela salvação do Mundo.

 


O Padre Correia da Cunha fez-se muitas vezes peregrino do Santuário de Fátima, com aquela devoção filial, afectuosa e naquele local elevava a sua mente ao alto, suplicando a Deus para que Fátima continue sempre assim: enfim, que se conserve intacto este torrão, sagrado tal espírito de oração, recolhimento e penitência.
 

Seja-me permitido lembrar que foi no Santuário de Fátima, onde o Padre Correia da Cunha celebrou as suas bodas de prata sacerdotais, no dia 29 de Junho do ano de 1965. Na pagela editada para memorizar o evento, constava: “ Aleluia! Aleluia! Aleluia! Bendito seja o Senhor, Pai, Filho e Espirito Santo! Bendito seja a sempre Virgem Maria, Mãe de Jesus e nossa Mãe!”
 
 


 

Fátima era um espectáculo de fé que se renovava a cada ano, com imensas peregrinações da família naval, da paróquia de São Vicente de Fora, das OGFE…

A fé move multidões, marcando-lhes um caminho e fixando-lhes um alvo.

 

O Padre Correia da Cunha, como já referi, realizou imensas peregrinações ao Santuário de Fátima. Todos guardamos ainda o entusiasmo que colocava na sua chegada junto da capelinha das aparições. Dizia ele: “ Levantai as vossas orações juntamente com a minha à Nossa Mãe do Céu, pedindo-lhe que abençoe esta bela e santa gente da Paróquia de São Vicente de Fora”.

 

Só depois é que cada um se recolhia para pedir a bênção para o Mundo e que Maria obtenha de Deus a justiça e a paz. Que todos os cristãos sejam a imagem viva do seu divino filho, o qual derramou todo o seu sangue pela redenção da humanidade. Que todos vivam o Evangelho e dêem testemunho de Cristo na sua vida particular, na família, na sociedade, na escola, na empresa… de modo que haja na Terra uma maior convivência fraternal, maior compreensão, mais harmonia e uma mais intensa vivência no amor ao próximo.

 

O Padre Correia da Cunha amava estas peregrinações que organizava como um culto de amor e muito entusiasmo. Eram magníficas estas experiências de fé em Louvor da Virgem Santa Maria – Nossa Senhora.

 

Tudo aquilo que se passava naquele rincão do “paraíso” era um milagre de comunhão humana. Todos ajoelhados em penitência, orávamos comovidamente embalados pelo cântico lancinante de Avé! Avé ! Avé Maria!

 

 A Virgem do Rosário, na sua pequenina capelinha, abençoava a multidão que a venerava apaixonadamente. Ela estava ali e não estava. É do Céu e da Terra. É rainha e o seu leito era coberto das mais belas flores e pétalas. Eram chamas de orações que chegavam aos seus pés como oferendas de amor ou puras oblatas de fé.

 

Tenho uma  imagem do Padre Correia da Cunha naquele Santuário, com uma lágrima no olho no final da cerimónia no momento do comovente hino “ Adeus à Virgem”. Nesse mesmo momento, milhares de lenços brancos a adejar no vasto recinto pareciam desprenderem-se, voar, para o céu; eram bandos de asas brancas aos milhares que ainda palpitavam, mesmo quando a imagem já não se distinguia ao longe.

 

O adeus à Virgem é um espectáculo de afectos e emoções, como o referia então o saudoso Padre Correia da Cunha.













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quinta-feira, 2 de maio de 2013

PE. CORREIA DA CUNHA E O RESTAURO DO ORGÃO IBERICO










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“AS GRANDES VIRTUALIDADES DO ÓRGÃO IBÉRICO GANHAS COM O RESTAURO DO INSTRUMENTO...”



Nos finais dos anos cinquenta, músicos da especialidade descobriam que os órgãos ibéricos possuíam uma série de aperfeiçoamentos que lhes conferiam um acréscimo notável de sonoridade e beleza de timbres.

A fama destes órgãos espalhou-se de tal modo, pelo mundo, que trouxe à Igreja de São Vicente de Fora, em Lisboa, um imenso grupo de organistas norte-americanos e europeus para a constatarem in-loco.

A Igreja de São Vicente de Fora é possuidora de um admirável órgão barroco ibérico de incalculável valor acústico que se encontrava votado ao abandono. Foi após muita insistência do Padre Correia da Cunha e Monsenhor Francisco Esteves, junto da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, que se realizou o primeiro grande restauro daquele magnífico órgão. Este trabalho intenso foi efectuado pelo Engº Ramos Sampaio e seu irmão, que foram considerados à época dignos do maior reconhecimento por grandes especialistas do talento organístico. 

Para celebrar o acontecimento do grande restauro, foi gravado pela Columbia, um disco com uma série de obras tocadas pelo organista norte-americano Powier  Biggs, em órgãos portugueses e espanhóis. Recordo que todo o trabalho de restauro foi executado integralmente em Portugal e com escassos recursos financeiros disponibilizados para o efeito, tendo em conta que o nosso país em 1958 era relativamente pobre, pouco desenvolvido e caracterizado por um isolamento político e económico.






O Padre Correia da Cunha tinha profunda consciência que por detrás daquele enorme baldaquino que cobre o altar-mor, se encontrava um dos mais importantes e representativos instrumentos barrocos portugueses, construído pelo organeiro João Fontanes de Maqueixa, no ano de 1765 (só em 1993 tivemos conhecimento da data da construção deste órgão e o nome do seu construtor, inscrito no secreto de eco:« Há feito de novo em anno 1765 João Fontanes de Maqueixa»).

No convívio com o seu grande amigo Guilton o Padre Correia da Cunha tomaria também conhecimento que o órgão ibérico possuía um elevado potencial para a execução de música moderna, em especial da obra de Messaiens, seu mestre e dos autores como Himdemith e Schonberg.
  





Em São Vicente de Fora, Guilton confidenciara ao Padre Correia da Cunha que o “seu” órgão oferecia aos músicos contemporâneos um especial brilho e as obras executadas naquele instrumento tão apurado, com os seus 3.115 tubos e múltiplos registos, geravam possibilidades sui generis.





O Padre Correia da Cunha arrepiava-se quando naquele magnífico órgão o Jean Guilton executava peças de Couperin que enchiam o templo de maravilhosos sons. A beleza sonora do órgão ibérico é realmente surpreendente, quando haja qualidade do executante.







No dia 14 de Maio de 1958, Jean Guillon executou no Órgão de São Vicente de Fora um concerto que foi um êxito absoluto. Este concerto aliava a um órgão de imensa qualidade e bem conservado, o elevado nível do concertista e assim como o programa escolhido: Carlos Seixas, Frei Jacinto, J.S. Bach, D. Scarlatti e François Couperin.



Em 1993, no âmbito de Lisboa Capital Europeia da Cultura, procedeu-se a um novo e profundo restauro deste órgão ibérico pelos suíços Cláudio e Christine Rainolter, tendo sido desmontado na totalidade o instrumento e enviado para o estrangeiro, onde se procedeu ao seu respectivo restauro.


Criticar o restauro e beneficiações efectuadas nesta peça de arte durante as décadas de 50 e 60 parece-me imprudente e de um profundo desconhecimento dos meios financeiros do país. Estou seguro que o Padre Correia da Cunha condenaria esse restauro, se tal operação impossibilitasse tornar reversível essa exalta peça ao estado original. Era com mágoa que referia: “ Somos um país de pelintras…”



Só quem pode contar com rios de dinheiros, oriundos de fundos comunitários para a realização do evento de 1994 – Lisboa, capital europeia da cultura – se deu ao luxo de optar pela realização do restauro por artistas internacionais.



Não restam em absoluto dúvidas que o Padre Correia da Cunha bradaria aos Céus pela incompetência na defesa do património ocorrida com a destruição dos estuques pintados dos tectos do altar-mor e das capelas laterais que alteraram profundamente o imago do majestoso monumento renascentista, assim como a substituição das janelas de madeira do Mosteiro dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho por caixilharia de alumínio lacado.



Já cá não estarei também para ouvir as futuras gerações de artistas na área do bom restauro, reclamarem pelas imbecilidades cometidas na década de 90 naquela jóia arquitectónica. O Padre Correia da Cunha e eu, certamente estaremos com eles em espírito.



Quando em 1960, o Padre Correia da Cunha assumiu a Paróquia de São Vicente de Fora, muito do Património edificado encontrava-se em estado bastante lastimoso com as janelas sem vidraças e graves infiltrações a nível das coberturas.




O Padre Correia da Cunha sabia bem quais as prioridades para conservar aquele monstruoso monumento. Colocação de vidros nas janelas e telhados reparados. Estas obras, graças a si, foram concretizadas. Obviamente, para intervenções nos espaços interiores nunca houve verbas disponíveis. Há época, falava-se de 200.000 contos. Com a sua santa paciência, o Padre Correia da  Cunha dizia:” Haverá todo o tempo do mundo para restaurar o património interior pois ele será protegido pelas medidas realizadas. Num monumento deste tipo, o fundamental é ter as paredes e os telhados imunizados.”


Com estas operações, considerava o Padre Correia da Cunha poder-se preservar a sua riquíssima jóia. Saber esperar por vezes é um bom conselho.















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