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“ O IMPERADOR D.PEDRO I, EM 1972, ERA A
IMAGEM DO HERÓI LIBERTADOR DA NAÇÃO BRASILEIRA.”
Foi
há precisamente quarenta e um anos, no dia 10 de Abril do ano de 1972, que os
restos mortais do Rei D. Pedro IV, que se encontravam depositados no Panteão da
Dinastia de Bragança, foram transladados para bordo do paquete «Funchal» que os
transportaria para o Rio de Janeiro, capital imperial do Brasil.
Foi
no Mosteiro de São Vicente de Fora, com os raios de sol envergonhados a
despertarem sobre a bela cidade de Lisboa, que o Padre Correia da Cunha dava
início às cerimónias religiosas no interior do Panteão Real, perante a
esplêndida urna de pau-santo que se encontrava colocada sobre uma riquíssima
essa, junto do altar principal, rodeada por quatro círios e vasos com flores,
estando a mesma coberta por um sumptuoso pano de veludo roxo, bordado a ouro,
com as armas imperiais brasileiras e o monograma do soberano «P», de Pedro e
Portugal.
Nesta cerimónia privada estiveram presentes o Presidente do Conselho, Prof. Marcello Caetano, o Embaixador do Brasil, Prof. Gama e Silva, o Ministro da Defesa, General Sá Viana, o Ministro da Justiça, Prof. Almeida Costa, os membros da Comissão, constituída pelo Senhor Ministro da Marinha, Alm. Pereira Crespo, o Embaixador Dr. Manuel Homem de Mello, Almirante Sarmento Rodrigues, Prof. Lopes de Almeida, Dr. Jorge de Mello e ainda a princesa D. Teresa Maria de Orleães e Bragança, em representação da família imperial do Brasil.
Vitor Soares - Padre Correia da Cunha - João Paulo Dias |
Terminada a cerimónia litúrgica de exéquias, presidida pelo Reverendo Padre Correia da Cunha, acolitado por dois jovens, deu-se início ao cortejo no interior do Mosteiro, tendo sido transportada a urna, aos ombros de soldados do Exército Português, para o exterior do majestoso templo, onde foram prestadas as devidas honras militares por uma força do Batalhão de Caçadores 5, com Bandeira (mandada bordar pela Rainha D. Maria II e por ela oferecida a esse Regimento) e Banda. Lembro que D. Pedro IV fora comandante honorário desta prestigiada unidade militar.
No exterior da monumental igreja de São Vicente de Fora e nas ruas vizinhas, muita gente se concentrou para num profundo silêncio prestarem as suas últimas homenagens a D. Pedro IV, «Rei-soldado», vigésimo oitavo Rei de Portugal e primeiro imperador do Brasil.
Depois
de depositada num armão do Governo Militar de Lisboa, foi a urna levada em
cortejo por uma escolta a cavalo da Guarda Nacional Republicana para o Cais de Santa
Apolónia. A abrir o cortejo, estava o carro que transportava o Padre Correia da
Cunha e os dois acólitos: Vítor Soares e João Paulo Dias.
Passados
alguns minutos, o armão detinha-se ao princípio da rampa, expressamente
construída para acesso ao tombadilho do navio Funchal. Oito fuzileiros das duas
nacionalidades transportaram em seguida a urna para bordo. Simultaneamente dois
navios, um brasileiro e outro português, deram uma salva de vinte e um tiros. A
urna seria depositada em câmara ardente no salão nobre do paquete, devidamente
ornamentado em ordem a poder corresponder à importante missão.
Os
cento e cinquenta anos de independência, que o Brasil comemorou em Setembro
desse longínquo ano de 1972, não representaram uma separação da Mãe-pátria.
Durante os séculos, os dois povos implantados nas margens do Atlântico foram
caldeando destinos intensos e profundamente enraizados uns no outro. Era o que
significava a entrega fraternal por Portugal ao Brasil dos restos mortais de D.
Pedro IV de Portugal e I Imperador do Brasil. D. Pedro de Bragança regressou ao
Brasil. Ele que soube ser rei de duas pátrias, não saiu, afinal da Pátria comum
a portugueses e brasileiros.
No
final da tarde, o Presidente da República embarcou no paquete Funchal que o
levaria ao Brasil acompanhado da sua comitiva constituída pelo Ministro dos
Negócios Estrangeiros, Dr. Rui Patrício, Secretário de Estado da Informação e Turismo,
Dr. César Moreira Baptista; Embaixador para os assuntos da Comunidade
Luso-Brasileira, Almirante Henrique Tenreiro; Almirante Ferreira de Almeida,
General Andrade e Silva, General da Força Aérea Costa e Almeida; Secretário-Geral
da Presidência da Republica, Dr. Luís Pereira Coutinho, oficiais da Casa
Militar do Presidente da Republica; Comandante Guilherme Tomás, Coronel Soares
da Cunha e Major Rui Pereira Coutinho, chefe de gabinete do Ministro dos Negócios
Estrangeiros, Dr. Luís Navega chefe de gabinete do Secretário da Informação,
Dr. Duarte Guedes Vaz chefe do protocolo de Estado, Dr. Hélder de Mendonça e
Cunha, secretário do protocolo; Dr. Manuel Corte Real… a esposa e filha do
Chefe de Estado e o Padre Correia da Cunha.
No
final do dia, zarpou das águas do Tejo o transatlântico Funchal, o qual foi
escoltado por uma esquadrilha de barcos de guerra portugueses e brasileiros.
Na
capela instalada no salão nobre do navio, a urna contendo os restos mortais do
imperador era objecto de guarda de honra permanente efectuada por marinheiros e
oficiais de ambas as armadas. O Padre Correia da Cunha encarregava-se do
serviço religioso a bordo durante a viagem.
Na
manhã de 22 de Abril 1972, dia que rememora a chegada da esquadra de Pedro
Alvares Cabral ao Brasil, o Presidente da Republica Português Almirante Américo
Thomás, acompanhando os restos mortais de D. Pedro IV, chegava à baía de
Guanabara no Rio de Janeiro. O Imperador pôde contar com uma manhã maravilhosa
de sol radioso no regresso ao seu amado Brasil. A histórica viagem representava
muito mais que um gesto de fraternidade para com um país tão intimamente ligado
a Portugal, assumindo um transcendente significado nas relações
luso-brasileiras.
Como
sabemos, foi em Agosto de 1971, que o Presidente Emílio Medici solicitou ao
Presidente de Portugal que passasse ao Brasil a guarda dos restos mortais do Imperador
Pedro I, em São Paulo, berço da independência, no Monumento do Ipiranga, altar
da Pátria Brasileira.
Para
os portugueses ver partir o seu Rei não era motivo que o fizesse mobilizar,
pois restava-lhe o grande consolo de que o coração real, intacto e bem guardado,
permaneceria na cidade do Porto, na igreja da Lapa, por vontade de D. Pedro,
manifestada em testamento, e que com emoção continuamos a zelar perpetuamente.
A
peregrinação dos despojos de D. Pedro pelas capitais estatais do Brasil,
durante cinco meses, teve uma enorme mobilização da sociedade brasileira, que
transformara o primeiro imperador numa personagem histórica quase divina de uma
elevada paixão que era recordada pelas suas palavras proclamadas no dia 7 de
Setembro de 1822, nas margens do rio Ipiranga:
“ Independência ou Morte”
D.
Pedro era o herói da independência, forte, inteligente, audacioso, impetuoso
mas também sensível às necessidades do povo, daí ocupar no coração de cada
brasileiro algo próximo do sagrado e ter merecido tão caloroso acolhimento no
seu regresso à sua segunda Pátria.
Meses
mais tarde, para o encerramento das comemorações do 150º Aniversário da
Independência do Brasil, em Setembro, ocorreu a deslocação do Prof. Marcello Caetano,
chefe do governo português ao país irmão, para assistir ao sesquicentenário da
independência do Brasil. Tal acto constituiu um novo reforço dos laços que
sempre uniram as duas Pátrias Lusíadas. Este evento foi realmente um marco
elevado na Comunidade Luso Brasileira.
A
terminar, uma pequena nota sobre o processo de exumação do corpo de D. Pedro
IV, ocorrido no dia 24 de Março de 1972 no Panteão da Dinastia de Bragança no
Mosteiro de São Vicente de Fora, que confirmou que havida sido sepultado com
uniforme de general português, calçando botas de cavalaria e várias comendas
portuguesas e estrangeiras. O corpo apresentava deficiente preservação pelo que
fora envolvido em um pano branco bordado, oferta do Padre Correia da Cunha e
colocado no interior da sua nova magnífica urna, com ferragens em prata cinzelada,
tendo a tampa um crucifixo de prata e brasões das armas imperiais brasileiras e
reais portuguesas. No seu antigo mausoléu, estão depositados ainda hoje, os
três caixões originais (dois de madeira e um de chumbo) que durante cento e
trinta e oito anos acolheram os despojos reais e registava:
D.O.M PETRUS IV PORTUGALIA ET ALGARBIORUM REX PRIMUS
BRASILIAE IMPERATOR AC BRIGANTIAE DUX, JOAN VI
IMPERAT. AC REGIS FILIUS PATRIAE LIBERTATIS AD SERTOR E VINDEX DUM REG
NUM IN FILIAM CARISSIMAM MARIAM II, SPONTE TRANS LATUM EJUS DOMINE REGERET
OBIIT. MAXIMO. OMNIUM-LUSITA NORUM DIE XXIVSEPTEMBRO. NA. DOM MDCCCXXXIV
AETATIS SUAE XXXVI
No
mesmo ano, foi gravado na pedra do túmulo: “
Os restos mortais de D. Pedro IV, primeiro Imperador do Brasil, agora repousam no
Monumento Ipiranga em São Paulo, por decisão histórica do Governo de Portugal –
10-IV-1972”
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Figura de suma importância histórica para ambos os países, regente tanto do Brasil como de Portugal - D. Pedro I, imperador do Brasil, e rei Pedro IV, de Portugal - estava sepultado ao lado dos demais membros da família real de Bragança, governantes de Portugal de 1641 a 1910, no Panteão da Dinastia de Bragança situado no Mosteiro de São Vicente de Fora na cidade de Lisboa. Sua remoção seria uma perda significativa para o património nacional português. O Brasil, por sua vez, argumentava que diferente dos demais povos americanos, que têm nos seus panteões seus respectivos libertadores e patriarcas, o país possuía um túmulo vazio na base do Monumento do Ipiranga.
ResponderEliminarEm 13/8/1971 uma boa notícia, o presidente de Portugal, almirante Américo Thomaz, concordara em transladar e presentear o Brasil com os restos mortais do imperador. Aos portugueses falou sobre o sacrifício em pró de enriquecer e fortalecer os laços entre a comunidade luso-brasileira. “Assim repartidos entre Portugal e o Brasil os despojos de D.Pedro serão bem o símbolo de uma raça que, divida entre duas Pátrias, permanece, todavia, fiel à alma que lhe dá caráter no mundo e inspira pelos tempos afora os destinos lusíadas”, disse Américo Thomaz, deixando claro, que o coração não viria. Permaneceria na cidade do Porto, já que o próprio D.Pedro deixou-o, em testamento, à cidade.
No dia anterior, o presidente Médici expressara, em rede nacional de TV e rádio sua emoção; “brasileiros, não posso esconder minha emoção. Fala por si mesmo este fato que nenhuma eloquência poderia superar: no ano em que celebramos o sesquicentenário da nossa Independência, regressará ao Brasil o corpo daquele que, em sete de Setembro, às margens do Ipiranga, com a bravura, o arroubo e a paixão que eram a marca de sua personalidade, proclamou livres estas terras.”