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‘’ IN HOC SIGNO VINCES”
A largada de Brest foi espectáculo deslumbrante. Uma multidão de milhares de pessoas postadas ao longo das muralhas da cidade, para presenciarem este grandioso espectáculo marinheiro.
O Padre Correia da Cunha recordava com imensa saudade esses tempos. Para ele, a «Sagres» era a grande escola do mar! Era neste navio protegido pela Cruz de Cristo, que trepando-se às vergas debaixo de mau tempo, se faziam os verdadeiros homens do mar.
Participavam nesta regata, para além da nossa «Sagres», na classe de grande porte, mais dois descomunais concorrentes «Chistian Radich», Norueguês e o «Mercator», Belga e mais quatro barcos menores, dois da França, Itália, Holanda e Argentina. Ao todo, vinte concorrentes, tripulados por gentes que encontram no mar um dos maiores encantos das suas vidas.
Para esta odisseia, embarcaram na nossa «Sagres», com o estatuto de honrosos convidados, prestigiadas figuras das quais me cumpre destacar o Contra-Almirante Francês Sacaze, o jornalista Suíço André Guex, o Dr. Oliveira Pinto, filho do saudoso Vice-Almirante Fernando d’Oliveira Pinto, uma equipa da Televisão Francesa e dois cadetes ingleses da London Nautical School.
Os primeiros dias da Regata foram desoladores por falta de vento, mantendo-se bastante próximos os três navios de grande porte. Só dias depois é que o Comandante Tengarrinha mandou largar «cutelos» e «varredouras» para aproveitar a valentia do vento. A «Sagres», a todo o pano, chegou a atingir dez nós.
O capelão Correia da Cunha terá guardado na memória até aos seus últimos dias a verdadeira sinfonia de vozes das ordens do comandante: Vamos! Chega para os cabos da gávea! Pega nos brióis e nas cerzideiras! Vai arriando a escota, carrega o estingue, carrega os brióis! Aguenta o balanço! Tesa a talha da verga, tesa os braços! Sai para a verga! Vocês da gávea: peguem no pano, ajudem ai com a talha do lais! Vamos! Abafa, anda com a mão, ó da gávea! Ferra, amarra bem!..
Foi nesta plena faina diária que muitas gerações de oficiais e marinheiros da «Sagres» colocaram no pedestal da glória o grande nome de Portugal por esses oceanos fora.
Sucederam-se dias e noites de brisas fracas de inquietação e de impaciências, tendo-se os navios perdido de vista. A «Sagres» entregue à sua excelente tripulação, lá seguia rumo às Canárias.
Segundo relato do Contra Almirante Félix António: “…houve tempo para uns concertos pela charanga de bordo e até para programas de variedades na coberta do navio, a cargo de alguns elementos mais dotados e desinibidos da guarnição”.
No dia 9 de Agosto, na camarinha do comandante, com toda a solenidade e presença de todos os oficiais a bordo, procedeu-se à colocação da foto oficial do novo Presidente da República, Contra-Almirante Américo de Deus Rodrigues Tomás, que havia sido empossado nessas funções dias antes, na Assembleia Nacional. Todos recordamos ainda os factos ocorridos nessas atribuladas “eleições”, de 1958.
O capelão Correia da Cunha havia já enviado mensagem de felicitações ao seu bom amigo “marujo”, com o qual disponha de excelentes laços de amizade, ao longo de muitos anos. Jamais será excessivo realçar que também com toda a família mais próxima do mesmo, cuja amizade foi escorada até ao final da sua vida.
A monotonia imposta
pelas condições meteorológicas não afectava o entusiasmo da tripulação da
«Sagres». Cada milha vencida era uma nova perspectiva que se abria para a
grande vitória, que todos sonhavam ardentemente e que certamente desta vez lhes
caberia.
Finalmente, a Grande
Canária, cujo farol de la Islota se avistou ao longe…
Depois de cortar a
linha da meta para o navio, a prova estava terminada. Mas quem havia ganho
efectivamente a regata? Começou então a vigília da esperança. Na vigia, os
valentes homens da «Sagres» tiveram que aguardar seis horas. Muitos marinheiros
treparam lestos para as vergas mais altas dos mastros, procurando no negrume da
noite descortinar qualquer luz que lhes indicasse a presença de algum navio
competidor. Mas nem uma luz no horizonte. Não houve um só marinheiro da
«Sagres» que recolhesse para dormir, pois aquela noite seria memorável para
todos eles, na obstante a dura e incansável fadiga de terem vivido doze dias de
trabalho executado com imenso prazer.
Já não restava dúvidas,
a «Sagres» ganhara a Regata Oceânica Brest- Las Palmas na classe dos Navios
Escola.
Como membro activo da
excelente tripulação, o Capelão Correia da Cunha auxiliou e contribuiu para a
consubstanciação desta grandiosa conquista, pois para além do esforço físico e
da dedicação dos nossos honrosos oficiais e valentes “marujos”, a fé
inquebrantável da ajuda divina, desde a primeira hora desta arrojada viagem,
estava confiada ao Padre Correia da Cunha que escrevera sobre esta viagem: “Grande glória a
nossa, sermos escolhidos pela Providência para desempenhar o primeiro papel: -
de nos embalarmos nas ondas… nesta velhinha «Sagres» que transportara a mais
fecunda semente da Cristandade.”
Em sinal de júbilo,
acenderam-se os projectores a bordo. O navio rebrilhava sob a luz esfusiante,
os oficiais abraçavam-se. Havia lágrimas nos olhos de muitos marinheiros mas
era um delírio. A banda de bordo atacou com um marcha militar de exaltação e um
coro de centenas de vozes aclamaram a vitória da velha «Sagres»: “GANHÁMOS!
GANHÁMOS! VIVA! VIVA A «SAGRES»!”
Contínua…
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