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“ Naquele órgão havia uma infinidade de melodias
adormecidas, à espera que Michael Kearns as acordasse do seu sono…”
O Padre
Correia da Cunha, dono de um imenso talento e de grande sensibilidade musical
admirava e compreendia como ninguém o génio dos grandes artistas. Hoje iremos
lembrar um dos seus dilectos organistas: MICHAEL KEARNS.
Nascido
no Canadá, fez os primeiros estudos musicais no Conservatório Real de Toronto.
Premiado com uma bolsa de estudos pelo Governo Francês, esteve seguidamente em
Paris, durante quatro anos, a estudar análise musical com Nadia Doulangedr e
cravo com Raphael Puyana.
Apaixonado
pela música e instrumentos do século XVII, MICHAEL percorreu a Inglaterra,
Bélgica, Holanda e Espanha para tocar órgãos e cravos antigos, aprofundando
assim os seus conhecimentos sobre a música daquela época (interpretação e
estilo).
Esteve
em Portugal desde Outubro de 1968 como bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian
para investigar a Arte Barroca Portuguesa sob a direcção do Prof. Santiago
Kastner.
MICHAEL
deu concertos e recitais em várias cidades canadianas e europeias. No ano de
1967, tocou em St. Séverin de Paris a Oratória St. Joseph à Montreal, tendo
também realizado concertos para a Société
Rudio – Canadá, para a ORTF
(Televisão Francesa) e para a nossa Emissora Nacional. Em Setembro de 1968
acompanhou o violinista Yehudi Menuhin e a Orquestra Nacional do Mónaco sob a
direcção de Igor Markevitic.
O
Padre Correia da Cunha para coroar as festividades em honra de São Vicente que
se celebravam a 22 de Janeiro de cada ano, promovia em colaboração com a Camara
Municipal de Lisboa a realização de um concerto de órgão na igreja do santo
diácono. Convidava para o efeito os maiores organistas seus amigos.
Recordo
hoje uma pequena história: O Padre Correia da Cunha ao tomar conhecimento da
reconhecida impossibilidade da vinda do organista francês Francis Chapelet para
o concerto agendado para o dia do Santo Padroeiro de Lisboa, teve de propor à última
hora, ao Presidente da Camara, o nome do jovem MICHAEL KEARNS afiançando-lhe
tratar-se de um dos mais conceituados e prestigiados organistas internacionais.
A
Presidência da Camara Municipal de Lisboa atendeu à sua proposta e consentiu a
alteração de última hora. Naquela noite a edilidade pôde oferecer aos seus
munícipes, na grandiosa igreja do Santo Patrono uma realização artística do
mais elevado nível. Recordo que esse concerto foi um grande acontecimento
artístico não só pelo órgão ser considerado um dos melhores instrumentos
daquela época áurea mas por terem sido executadas em primeira audição musical, vários
manuscritos do setecentista Frei Conceição da Cidade do Porto.
Este
jovem organista desde a primeira hora se deixou entusiasmar pelo órgão de São
Vicente de Fora.
MICHAEL KEARNS diariamente se deslocava à
Igreja de São Vicente de Fora demostrando assim o extraordinário interesse e
evidente devoção que possuía por aquele instrumento singular.
Afirmava
o Padre Correia da Cunha que poucos como MICHAEL conheciam as possibilidades e
recursos do nosso órgão ibérico. Os bons apreciadores de música adoravam escutar
as suas execuções artísticas disfrutando também da excelente qualidade arquitectónica
do templo renascentista.
O
Padre Correia da Cunha era com orgulho que ouvia da parte de célebres
organistas grandes elogios, ao talento e modéstia do organista e cravista MICHAEL
KEARNS. Apesar de ser dotado de génio, não lhe era difícil criar amigos e
conversar alegremente com a juventude da Comunidade Paroquial. Todos lhe tributávamos
muita admiração pela sua enorme simpatia e cortesia.
Ao
escrever este breve texto de Homenagem ao organista predilecto do Padre Correia
da Cunha consigo recuar no tempo e lembrar os muitos e bons momentos musicais
escutados durante a minha adolescência e juventude em São Vicente de Fora.
Parece
hoje intangível a paixão que acendia na imensa juventude de São Vicente de Fora
ao escutarmos em total silêncio os recitais de órgão, pelas mágicas mãos do
genial amigo MICHAEL.
Gostaria
de agradecer ao Padre Correia da Cunha e aos muitos organistas que nos guiaram
na descoberta da mais bela música organistica que nos permitia experimentar a
maravilha da pura beleza e nos elevava a um estado espiritual que invadia de
alegria os nossos corações. Bem Hajam!
O
Padre Correia da Cunha como brilhante clérigo, humanista e distinto pedagogo
bem sabia que desde o momento da criação que o desejo mais profundo do nosso
coração é ter a união perfeita com Deus.
Reconheço
hoje que as suas longas prelecções sobre a temática da música erudita que teimosamente
pretendia levar ao nosso mundo irreal era a metodologia para nos ajudar a
crescer e a viver na Graça. Com essas experiencias ali vividas, ouvindo o
esplendoroso órgão e as deslumbrantes orquestras, ainda hoje, compreendo bem
que contribuíram para recuperar a nossa identidade como Filhos de Deus.
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