“NO SERVIÇO DA LITURGIA, DA PALAVRA E DA CARIDADE.”
Na vida de um grande mestre sempre escapam, frequentemente, ao nosso conhecimento aspectos ligados à sua biografia por muito genéricos que estes sejam.
A grande preocupação do Diácono Correia da Cunha era colocar em prática as palavras que o exortavam a servir o altar, baptizar e pregar…Eram essas as palavras que ressoavam na sua mente naquela Solenidade da Epifania do Senhor, dia da sua ordenação diaconal (6 de Janeiro de 1940).
«Resplandeçam as virtudes evangélicas; o amor sincero, a solicitude para os enfermos e os pobres, a autoridade discreta, simplicidade de coração e uma vida segundo o espírito.»
Não houve o mínimo de preocupação em registar esse
acontecimento na sua biografia.
Hoje procuro preencher essa lacuna com a transcrição de um
texto da sua autoria que preparou para a homilia no dia da sua ordenação
diaconal na sua paróquia de Arroios, onde residiam os seus pais.
Esta peça literária demostra bem o seu pensamento e a sua energia
ao serviço da Igreja. É sabido que o jovem seminarista José Correia da Cunha sempre
esteve constantemente perto do Cardeal Manuel Cerejeira, e que sempre mereceu
da parte deste uma enorme estima e consideração pelas suas largas competências
que já se revelavam quer no campo teológico quer no domínio do latim.
É desconhecido o Prelado ordenante do diácono Correia da
Cunha, mas dada a protecção que o Cardeal lhe garantia, estou certo que terá
sido o próprio Cardeal Patriarca de Lisboa – D. Manuel II Gonçalves Cerejeira.
Mas o facto de ter escrito este texto para a homilia no dia da sua ordenação
diaconal garante-nos que foi no dia dos Santos Reis Magos.
Não há notícias fidedignas sobre este importante
acontecimento, carecendo de comprovação para serem tidos como fiáveis dado que
os seus colegas de seminário já nenhum se encontra entre nós.
O jovem clérigo Correia da Cunha sentava-se com muita frequência
à mesa com o Cardeal Cerejeira que lhe professava grande simpatia e admiração
pela profundidade dos conhecimentos deste seu dilecto discípulo. Sempre gozou
da protecção do seu bispo tal como testemunham várias cartas e dedicatórias que
chegaram até nós. Já lhe eram reconhecidas grandes qualidades que vaticinavam
que viria a ser não só um grande pregador como um insigne latinista.
Tenho em meu poder uma vasta colecção de poemas da sua lavra
bem organizados que indiciam a intenção de os integrar num livro de poemas a
editar.
Resta-me este manuscrito, que me parecem apontamentos para a homilia
no dia da ordenação diaconal que tão gostosamente passo a transcrever:
VÍDIMOS STELLAM EJUS IN ORIENTE
ET VENIMUS CUM MUMÉRIBUS
ADORARE DÓMINUM
Amados
irmãos em Cristo Senhor Nosso.
Entre os diversos encargos confiados ao diácono no dia da sua
ordenação está o de pregar. Ao diácono, diz o ritual da ordenação, compete
servir ao altar, baptizar e pregar.
O diácono, que, segundo a mais antiga tradição da Igreja, é também
chamado : Porta Cristo, deve servir ao altar apresentando à Trindade
Santíssima, por intermédio do sacerdote, os dons que os cristãos lhe oferecem
no Sacrifício da Missa; deve também levar às almas os dons de Deus (que digo
eu?) deve levar às almas o próprio Cristo nos Sacramentos do Baptismo e da
Sagrada Comunhão. O diácono é pois, o Porta Cristo.
Mas não é só nestes dois sacramentos que o diácono comunica
Cristo às almas e leva as almas a viverem a vida de Cristo. Em virtude da sua
ordenação tem o mandato de distribuir às almas o Sacramento vivo da Palavra de
Deus: ao diácono compete pregar levar ao mundo a luz de Cristo. Basta recordar
a linda cerimónia de sábado santo tão rica em cor e sentido místico: a bênção
do círio pascal que o diácono acende e cujo elogio canta solenemente é a
expressa adoração simbólica de Cristo luz das inteligências e fogo dos
corações. E é fogo desse amor e a luz
dessa doutrina que o diácono deve mostrar á terra iluminando-a e incendiando-a
no cumprimento daquela palavra de Cristo:
Eu vim trazer o fogo à terra e que quero eu senão que ela se acenda?
É pois, amados irmãos, o diácono o dispensador deste mistério que se chama
- Palavra Divina.
O diácono deve pregar, fazer fulgir nas almas a luz do Círio
Pascal, a luz da estrela misteriosa que guiou os magos a Jesus.
Pela primeira vez venho desempenhar essa missão na própria
igreja onde eu também nasci para a vida de Cristo e onde essa vida divina foi
sustentada e amparada pela recepção dos sacramentos e pela ilustração da Palavra
de Deus.
Sinto o peso de tamanha responsabilidade e peço aquele menino
cujo nascimento, há pouco celebramos e que ali está revestido das espécies
sacramentais como no presépio estivera revestido de humildes paninhos.
Só lhe peço a graça de não ser eu a falar, mas Ele a
falar-vos por mim e que como outrora se serviu de uma estrela para irradiar a
sua Luz sobre a inteligência dos magos e a guiar até Belém se sirva agora da
minha pobre palavra para vos iluminar a vós e vos guiar ao seu divino convívio;
para que nós todos também possamos dizer como os magos ofertando-lhe os nossos
dons:
VÍDIMOS STELLAM EJUS IN ORIENTE
ET VENIMUS CUM MUMÉRIBUS
ADORARE DÓMINUM
Diz-nos o Sagrado Evangelho que tendo Jesus nascido em Belém
uns magos do oriente vieram a Jerusalém dizendo: Onde nasceu o Rei dos Judeus?
Porque nós vimos a sua estrela no oriente e viemos adorá-lo.
O Rei Herodes ouvindo isto ficou perturbado e toda a
Jerusalém com ele; e convocando todos os príncipes dos sacerdotes e escribas do
povo, perguntou-lhes onde devia nascer, o Rei dos Judeus.
Foi-lhe respondido que o Messias devia nascer em Belém, terra
de Judá, não és certamente a mais pequena terra de Judá porque de ti sairá o
Chefe que há-de guiar Israel, meu povo.
Então Herodes tendo chamado secretamente os magos informou-se
cuidadosamente do tempo em que a estrela lhes aparecera e depois enviando-os
para Belém disse-lhes: informai-vos diligentemente acerca do menino e vinde
depois comunicar-me para que também eu o vá adorar.
E assim instruídos os magos partiram. E eis que a estrela que
tinham visto no oriente lhes reapareceu e os foi guiando até à casa onde estava
o menino. Ao verem a estrela os magos exultaram com grande alegria. E tendo
entrado na casinha encontraram o Menino com sua mãe e prostrando-se o adoraram;
depois abrindo os seus tesouros, ofereceram –lhe ouro, incenso e mirra. Eles
avisados em sonhos de que não voltassem a Herodes por outro caminho foram para
suas terras.
E assim com toda a singeleza e simplicidade nos conta São
Mateus a vinda dos magos a Belém onde encontraram Jesus.
Entre os inumeráveis ensinamentos que poderíamos colher deste
texto evangélico eu só quero deter a vossa atenção sobre estes dois pontos que
são de máxima importância para a nossa vida espiritual.
Primeiro: a vocação maravilhosa dos magos primícias que foram
da vocação dos genes do cristianismo.
Segundo: a correspondência pronta e generosa à graça de
eleição divina.
Terceiro conclusões práticas que devemos tirar para a nossa
vida cristã.
VÍDIMOS STELLAM EJUS IN ORIENTE. Nós vimos a sua estrela no
Oriente. Tal é o grito de contentamento que sempre espontâneo dos corações dos
magos. Eles viram a estrela do Senhor. Foram iluminados por uma luz misteriosa
que finalmente lhes mostrou Jesus e é isso que esta festa se chama epifania ou
festa da manifestação do Senhor. Assim como aos judeus Jesus se tinha
manifestado na pessoa dos pastores assim também se manifesta hoje aqueles que
não eram do seu povo eleito mas que Ele havia de trazer ao seu aprisco como
dirá mais tarde: Eu tenho ainda outras ovelhas que é preciso conduzir ao meu
aprisco.
Na noite de Natal é esplendor de aparições angélicas que
conduz os pastores ao presépio hoje é a cintilação duma estrela que leva os
magos a Belém.
Qualquer destes modos de iluminação interior leva a Cristo:
aquele que é a Luz do Mundo a que há-de brilhar mais naqueles para quem não
fora expressamente enviado porque os seus, os judeus, não o quiseram receber,
fecharam os olhos à luz…E por isso Cristo revela-se aos pagãos, fazendo seus
irmãos, filhos de Deus, não os que nasceram do sangue de Abraão, nem os que se
fiam em cálculos mesquinhos, mas os guiados pela sua Luz, viram n’Ele a própria
Luz, acreditando n’Nele. E neste número, irmãos estamos todos nós. Também para
todos nós brilhou a luz da fé, vídimos stellam, também nós vimos as cintilações
dessa estrela bendita que nos leva Aquele que, sendo o Caminho, a Verdade e a
Vida é a Luz.
Todo o homem que vem a este mundo procura a luz, quer a luz;
mas ai, como tantos se enganam.
Alguns enganados por mentirosas miragens qual borboletas
doidas vão guinar-se na fascinação da bagatela, prendem-se às ninharias e
vaidades da vida e nada mais vêem.
Outros seguem o fulgor quente do prazer e embebedem-se no
materialismo da vida para esses só o prazer conta e tudo são capazes de sacrificar
sob os instintos animais a Vénus ou a Baco.
Outros ainda se deixam mostrar pelo falso brilho do ouro como
meio supremo para entrar no templo do prazer.
E quantos também não fecham os olhos à luz divina porque se curvam
culpável ou inculpavelmente perante o altar carunchoso duma ciência que
intencionalmente afasta de Deus…
Mas nós, amados irmãos, vimos a estrela do Senhor, recebemos
a sua fé, acreditamos n’Ele. Como os magos não nos detivemos em considerações
sobre o caminho a imitar.
Estava já mostrado pela luz da estrela: era seguir a sua
inspiração.
A luz da estrela é a luz de Deus que brilha para todo, o
homem porque Deus que brilha para todo o homem porque Deus a todos quer salvar
e a todos que leva ao conhecimento da verdade como diz São Paulo: Deus quis
mesmo vult salvos fiesi et ad ajuitirnem visitalis venir. Ele a luz de Deus
fulgir no meio de nós porque Deus é Luz diz São João: que gera um verbo de Luz:
o filho que se fez homem e encarnou o seu amor num coração de carne para que
nós pudéssemos sentir em nós as palpitações de um Coração Divino: Et lux erat
Verbum et Verbum caro factum est. E a luz era o Verbo e o Verbo se fez carne.
Aquele que os fariseus hão de chamar um dia sedutor começa
logo no berço a seduzir as almas.
Os magos vêem a sua estrela e porque a seguiram entraram na
humilde casinha que certamente São José já teria alugado para a Sagrada Família et intrantes domum. E nós também porque seguimos a estrela que para nós brilhou
no Santo Baptismo (embora a sua luz já fosse preparada para nós desde toda a
eternidade) entramos logo na Igreja de Cristo e assim como a estrela dos magos
parou sobre a casa onde estava o menino, assim também a estrela da nossa
vocação cristã parou sobre a Igreja indicando-nos que fora dela não está Jesus.
E é por isso que na epistola de hoje Isaías, num cântico magnifico de glória da
Igreja : «Levanta-te e resplandece porque
a tua luz chegou e a glória do Senhor se elevou sobre ti. Enquanto as trevas
cobrirem a terra e a obscuridade envolver os povos o Senhor manifestar-se-á em
ti, e a sua glória se levantará sobre ti.
As nações caminharão para a tua luz e
os reis para a claridade da tua aurora; dirige o seu olhar em redor e vê: todos
se juntaram e vêem para ti. Exulta e dilecta o teu coração porque todos virão a
ti trazendo ouro, e incenso e cantando os louvores de Deus!»
E no número de todos estes que entraram na Igreja estamos nós
que fomos baptizados, acreditamos na doutrina de Cristo (seguindo a luz que Ele
nos enviou) e unidos a Ele vivemos a vida divina e cantamos com os actos de
cada dia os louvores da Trindade Santíssima.
Mercê da vocação cristã, todos os que estamos em graça
fazemos parte do Corpo Místico de Cristo. Foi essa a primeira graça que nos
alcançou tantas e tantas outras pela vida adiante. E se não fora essa a primeira graça ao nosso chamamento ao
Cristianismo, á Igreja Católica, talvez não teríamos tanta felicidade de
chegarmos a gozar de Deus.
Agradeçamos tamanha graça e pedindo, como nos ensina a oração
da missa, a graça de chegarmos a contemplar o fulgor da majestade divina
aqueles a quem foi revelado Jesus pela estrela da vocação cristã, não
esqueçamos de pedir também a mesma graça para quantos seguem o brilho do
prazer, do oiro ou da ciência sem Deus; nem tampouco nos esqueçamos de pedir a
Deus que faça brilhar a sua luz para aqueles que fazem ainda nas trevas do
paganismo ou nas sombras da morte espiritual.
Mas amados irmãos, além desta estrela cujo fulgor apareceu a
todos nós conjuntamente há ainda outras cintilações da estrela bendita que a
cada um individualmente a leva por especiais caminhos: é o chamamento
particular que cada um de nós dirige ao Senhor convidando-nos a subir mais e
mais a montanha da santidade.
Sim, amados irmãos, cada um de nós é objecto dum amor
especial de Deus que o convida a viver cada vez mais intensamente a sua vida
divina. A estrela da vocação cristã leva-nos a Cristo e faz-nos viver em Cristo
numa vida de santidade: Para cada um de nós há uma vocação especial à
santidade: sede santos porque eu sou santo. A santidade não é exclusivo
apanágio das freiras e religiosos que se enclausuraram num convento e
mortificam o corpo escondido por fortes e rudes estamenhas. Não! A santidade é
para cada um de nós porque Deus predestinou-nos desde toda a eternidade para
que fossemos santos e imaculados na sua presença. A vocação à santidade faz-se
ouvir no meio do mundo.
A vocação à santidade não é sinónimo de vocação sacerdotal ou
religiosa é o antes de vocação cristã porque todos nós por isso mesmo que somos
cristãos e seguimos a estrela da fé cristã, devemos ter a vida de Cristo em
nós, devemos viver mais que é sobretudo numa vida de Amor de Deus e ao próximo
e mais a vida da Igreja Corpo Místico de Cristo.
Nunca nos esqueçamos de que a Religião é uma vida e não um
sistema mais ou menos grandioso de preceitos morais e ensinamentos dogmáticos.
E assim, amados irmãos, os magos são as primícias da nossa
vocação cristã e o modelo da nossa vocação á santidade.
Consideremos agora a correspondência dos Santos Reis Magos
(como a tradição se comprova em chamá-los) e tiremos em seguida as nossas
conclusões:
As nações caminharão para a tua luz e os reis para a claridade da tua aurora; dirige o seu olhar em redor e vê: todos se juntaram e vêem para ti. Exulta e dilecta o teu coração porque todos virão a ti trazendo ouro, e incenso e cantando os louvores de Deus!»
Os magos viram a estrela e iluminados por uma luz interior que nela lhes mostrava a realização duma profecia divina seguiram logo a sua inspiração: VÍDIMOS STELLAM EJUS IN ORIENTEET VENIMUS CUM MUMÉRIBUSADORARE DÓMINUM
Que prontidão! Que generosidade! É admirável a fidelidade dos
magos à inspiração da graça. Não se detém em considerações inúteis, não
racionaram sobre a manifestação divina seguem logo a sua inspiração e se algum
tempo ainda se demoram é só o suficiente para puderem os seus alforges para as
necessidades da viagem e para recolherem suas riquezas que desejavam dar de
presente a Jesus, pois não querem aparecer de mãos vazias. E poem-se a caminho
sem receio algum.
Ah! Que lição de prontidão e generosidade em seguir a luz da estrela nos dão os magos! Quantos de nós correspondemos assim à vocação cristã e à vocação à santidade? Quando vimos nas trevas de que vimos a luz da estrela de Cristo e seguimo-la com tão pronta generosidade?Não nos detivemos nós em considerações egoístas e mesquinhas sobre a vontade de Deus e sobre as dificuldades que para a realizarmos iriamos encontrar ?
Se para os que não crêem em nome de uma ciência, astrólogos e
conselheiros de Reis, para nós os que acreditamos o seu procedimento generoso é
uma censura.
Nós não tivemos tantas dificuldades como eles. Graças a Deus,
nascemos num país de tradições cristãs, no seio duma família cristã e vivemos
numa sociedade que, se não é praticamente cristã tem ainda esse rótulo e
procura poder conservá-lo. Tudo pois nos ajudou mais do que a eles tanto a
encontrarmos Jesus como a viver mais e mais a sua vida divina.
Os magos não temeram o escárnio nem o insulto dos que os viam
passar, nem tão pouco se deixaram influenciar pela indiferença e ódio que
encontraram em Jerusalém precisamente entre aqueles que deviam ser os primeiros
a exultarem de contentamento.E quantas vezes não retrocedemos no nosso caminho para Deus
só porque alguém que ainda não viu a estrela nos dirige uma censura ou
ironicamente nos apelida de beatos ou santinhos…
Quantas vezes nos não escandalizaram com a indiferença e até
indignidade (que infelizmente também há) daqueles que Deus colocou em lugar na
sua Igreja para nos guiarem a Jesus e nos darem a sua vida.
Os magos em Jerusalém não tinham a boa estrela, pois ela
deixara de brilhar não em razão da indignidade das autoridades religiosas dessa
capital, mas porque Deus não quer guiar as almas com luzes extraordinárias
quando elas se podem reger pela luz da autoridade legitima ainda que indigna,
os magos não tinham a luz da estrela e por isso seguiram os ditames oficiais
daqueles que ainda representavam Deus junto dos homens.
Que exemplo para nós! Quando a autoridade de Deus estiver
escondida em superiores indignos com Cristo Jesus ali está escondido debaixo
das aparências de pão, não consideremos a indignidade dos homens, vejamos mais
um prodígio da misericórdia de Deus e sigamos os seus ensinamentos; sigamos o
caminho, por eles traçados e teremos a consolação de ver novamente a estrela e
de irmos a Jesus.
Chegados a Belém os magos encontraram finalmente ajuda porque
tanto ansiavam. Mas que vêem eles? O Rei dos Judeus sentado em magnifico trono
e revestido de purpuras e borcados?
- Não! Vêem um menino fraquinho como toda a criança
pequenina, um menino que em nada se distinguia dos outros a não ser pela
extrema pobreza em que vivia. O seu trono era o colo duma donzela, humilde
judia que nem sequer mostrava no seu porte exterior as inúmeras graças com que
fora cumulada por Deus e ao lado, talvez carpinteirando um homem forte e rude
daqueles braços judeus que ganham o pão com o suor do seu rosto o pão de cada dia.
Tudo com a aparência humilde duma casita pobrezinha. Mas uma
coisa há que lhes não deixa enfraquecer a fé; a estrela, que parou sobre aquela
casa e intencionalmente lhes diz que aquela criança é o Filho de Deus, gerado
nos esplendores da eternidade, o Verbo, a expressão substancial do Pensamento
eterno e infinito, a Luz que guia todo o homem que vem a este mundo.
E só isto explica a virtude dos magos.
E abrindo os seus tesouros ofereceram-lhe ouro, incenso e
mirra e prostrados por terra o adoraram.
E são estas considerações que nos restam fazer. Uma vez chegados a Jesus prostremo-nos por terra como
os magos: et prostermemus e adoremos-lo et admvert cum e ofereçamos enfim os
nossos dons: et obtuberunt ei aurum thus et mirram.
Prostramo-nos por terra num gesto de submissão amor e
agradecimento. Lembremo-nos de que a atitude mais digna do homem e estar de
joelhos perante Deus. E nós cristãos quando nos ajoelhamos, é sempre só perante
Deus. Não nos ajoelhamos como tantos desprovidos perante os prazeres voluptuosos
da carne, nem perante a mentira do ouro, nem perante o ídolo
Nós ajoelhamo-nos perante uma criança nua nascida na pobreza
porque cremos que uma criança é Deus, ajoelhamos perante aquela hóstia
consagrada que tem todas as aparências de pão porque aquela hóstia é o Corpo
vivo de Cristo, ajoelhamos perante alguns homens como os bispos e o papa,
porque sabemos que esses homens encarnam, por graça especial de autoridade e
pessoa de Deus junto de nós. Ajoelhemo-nos pois e adoremos. Como toda a Santa
Igreja que somos membros adoremos a Trindade Santíssima adoremos aquela hóstia
que é Cristo e verbo de Deus feito carne nas aparências de pão. Como os Santos
Reis magos que a julgar pela descrição evangélica, nada disseram a Jesus,
lancemo-nos também por terra numa adoração silenciosamente eloquente.
A nossa freguesia celebra hoje a solenidade da adoração
reparadora. Unamo-nos todos ao espirito dessa piedosa associação e adoremos e
reparemos as ofensas cometidas contra a luz de Deus porquanto vem a estrela e
não queremos seguir; temos medo dos espinhos da caminhada e por isso fechamos
os olhos propositadamente.
Adoremos em reparação mas adoremos também em acção de graças
pelo Dom da iluminação da estrela que Deus nos enviou, pela força e coragem que
Deus nos deu para a seguirmos.
E finalmente ofereçamos-lhe os nossos dons. Não cheguemos a
Jesus com as mãos vazias (os magos viram a estrela e vieram, mas com dons,
adorar Jesus).Nós teremos talvez o ouro, o incenso e a mirra. Mas temos com
certeza um coração palpitando de amor que é superior a todo o ouro da terra,
temos o incenso da nossa homenagem e
adoração e temos mirra do nosso espírito de sacrifício para seguirmos sempre a
luz da estrela.
Púnhamos esses dons ali sobre, o altar e ofereçamo-los a
Jesus Menino com a generosidade dos reis magos por todos aqueles que vagueiam
na noite escura da ignorância do erro ou da dúvida, para que os que estão nas
trevas e sombra da morte: pobres infiéis e por nós os que vamos seguindo a
estrela para que todos nós juntos na catolicidade da Igreja saibamos dar a Deus
tudo quanto temos lembrando-nos sempre que quem não chega a dar tudo nunca deu
nada. Demos pois com toda a generosidade para que tendo visto a estrela do
Senhor e tendo-a seguido neste mundo possamos chegar a contemplar no céu as
belezas da luz infinita de Deus.
Diac. Correia da Cunha
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