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“AS GRANDES VIRTUALIDADES DO ÓRGÃO IBÉRICO GANHAS COM O RESTAURO DO INSTRUMENTO...”
Nos
finais dos anos cinquenta, músicos da especialidade descobriam que os órgãos
ibéricos possuíam uma série de aperfeiçoamentos que lhes conferiam um acréscimo
notável de sonoridade e beleza de timbres.
A
fama destes órgãos espalhou-se de tal modo, pelo mundo, que trouxe à Igreja de
São Vicente de Fora, em Lisboa, um imenso grupo de organistas norte-americanos e europeus para a constatarem in-loco.
A
Igreja de São Vicente de Fora é possuidora de um admirável órgão barroco
ibérico de incalculável valor acústico que se encontrava votado ao abandono. Foi após muita insistência do Padre Correia da Cunha e Monsenhor
Francisco Esteves, junto da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais,
que se realizou o primeiro grande restauro daquele magnífico órgão. Este trabalho
intenso foi efectuado pelo Engº Ramos Sampaio e seu irmão, que foram
considerados à época dignos do maior reconhecimento por grandes especialistas
do talento organístico.
Para
celebrar o acontecimento do grande restauro, foi gravado pela Columbia, um
disco com uma série de obras tocadas pelo organista norte-americano Powier Biggs, em órgãos portugueses e espanhóis.
Recordo que todo o trabalho de restauro foi executado integralmente em Portugal
e com escassos recursos financeiros disponibilizados para o efeito, tendo em
conta que o nosso país em 1958 era relativamente pobre, pouco desenvolvido e
caracterizado por um isolamento político e económico.
O
Padre Correia da Cunha tinha profunda consciência que por detrás daquele enorme
baldaquino que cobre o altar-mor, se encontrava um dos mais importantes e
representativos instrumentos barrocos portugueses, construído pelo organeiro
João Fontanes de Maqueixa, no ano de 1765 (só em 1993 tivemos conhecimento da
data da construção deste órgão e o nome do seu construtor, inscrito no secreto
de eco:« Há feito de novo em anno 1765 João Fontanes de Maqueixa»).
No convívio com o seu grande amigo Guilton o Padre Correia da Cunha tomaria também conhecimento que o órgão ibérico possuía um elevado potencial para a execução de música moderna, em especial da obra de Messaiens, seu mestre e dos autores como Himdemith e Schonberg.
No convívio com o seu grande amigo Guilton o Padre Correia da Cunha tomaria também conhecimento que o órgão ibérico possuía um elevado potencial para a execução de música moderna, em especial da obra de Messaiens, seu mestre e dos autores como Himdemith e Schonberg.
Em
São Vicente de Fora, Guilton confidenciara ao Padre Correia da Cunha que o
“seu” órgão oferecia aos músicos contemporâneos um especial brilho e as obras
executadas naquele instrumento tão apurado, com os seus 3.115 tubos e múltiplos
registos, geravam possibilidades sui generis.
O
Padre Correia da Cunha arrepiava-se quando naquele magnífico órgão o Jean
Guilton executava peças de Couperin que enchiam o templo de maravilhosos sons.
A beleza sonora do órgão ibérico é realmente surpreendente, quando haja
qualidade do executante.
No dia 14 de Maio de 1958, Jean Guillon executou no Órgão de São Vicente de Fora um concerto que foi um êxito absoluto. Este concerto aliava a um órgão de imensa qualidade e bem conservado, o elevado nível do concertista e assim como o programa escolhido: Carlos Seixas, Frei Jacinto, J.S. Bach, D. Scarlatti e François Couperin.
Em
1993, no âmbito de Lisboa Capital Europeia da Cultura, procedeu-se a um novo e profundo restauro deste órgão ibérico pelos suíços Cláudio e Christine
Rainolter, tendo sido desmontado na totalidade o instrumento e enviado para o
estrangeiro, onde se procedeu ao seu respectivo restauro.
Criticar
o restauro e beneficiações efectuadas nesta peça de arte durante as décadas de
50 e 60 parece-me imprudente e de um profundo desconhecimento dos meios
financeiros do país. Estou seguro que o Padre Correia da Cunha condenaria esse
restauro, se tal operação impossibilitasse tornar reversível essa exalta peça ao
estado original. Era com mágoa que referia: “ Somos um país de pelintras…”
Só
quem pode contar com rios de dinheiros, oriundos de fundos comunitários para a
realização do evento de 1994 – Lisboa, capital europeia da cultura – se deu ao
luxo de optar pela realização do restauro por artistas internacionais.
Não
restam em absoluto dúvidas que o Padre Correia da Cunha bradaria aos Céus pela
incompetência na defesa do património ocorrida com a destruição dos estuques
pintados dos tectos do altar-mor e das capelas laterais que alteraram
profundamente o imago do majestoso monumento renascentista, assim como a
substituição das janelas de madeira do Mosteiro dos Cónegos Regrantes de Santo
Agostinho por caixilharia de alumínio lacado.
Já
cá não estarei também para ouvir as futuras gerações de artistas na área do bom
restauro, reclamarem pelas imbecilidades cometidas na década de 90 naquela jóia
arquitectónica. O Padre Correia da Cunha e eu, certamente estaremos com eles em
espírito.
Quando em 1960, o Padre Correia da Cunha
assumiu a Paróquia de São Vicente de Fora, muito do Património edificado
encontrava-se em estado bastante lastimoso com as janelas sem vidraças e graves
infiltrações a nível das coberturas.
O Padre Correia da Cunha sabia bem quais as prioridades para conservar aquele
monstruoso monumento. Colocação de vidros nas janelas e telhados reparados.
Estas obras, graças a si, foram concretizadas. Obviamente, para intervenções
nos espaços interiores nunca houve verbas disponíveis. Há época, falava-se de
200.000 contos. Com a sua santa paciência, o Padre Correia da Cunha dizia:” Haverá todo o
tempo do mundo para restaurar o património interior pois ele será protegido
pelas medidas realizadas. Num monumento deste tipo, o fundamental é ter as
paredes e os telhados imunizados.”
Com
estas operações, considerava o Padre Correia da Cunha poder-se preservar a sua
riquíssima jóia. Saber esperar por vezes é um bom conselho.
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Lembro-me muito bem, de na "Casa dos Foles", ver, penso que 3 homens, a "bombar" ar para o órgão.
ResponderEliminarMais tarde, foi colocado um equipamento motorizado, que dispensou os braços humanos. Deve ter sido para ai no principio dos anos 50.