quarta-feira, 12 de junho de 2013

PE. CORREIA DA CUNHA E O ARRAIAL DA CERCA











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“Enquanto houver arraiais. Enquanto houver Santo António. Lisboa não morre mais.”

 

Era na véspera do dia de Santo António, um dos “quatro” Santos Populares de Lisboa, que o Padre Correia da Cunha se irmanava com os seus amigos paroquianos, no mesmo ardor, para viverem na folgança do arraial organizado pela paróquia, todos os anos na Cerca do Mosteiro de São Vicente de Fora.
A abertura do famoso arraial de beneficência da Paróquia de São Vicente de Fora, nessa noite festiva de Santo António, era um acontecimento de interesse popular para o pitoresco bairro e para a cidade de Lisboa.
Milhares de pessoas se deslocavam até aquela linda cerca, engalanada para o efeito, onde sabiam que tinham numerosos motivos de entretenimento. 

 
 
 
 
Tinha razão o Padre Correia da Cunha em mobilizar todos os seus paroquianos, os vários movimentos (Conferências de São Vicente de Paulo, Catequese Paroquial, Apostolado da Oração,Patronato de Nuno Alvares Pereira, Grupos de Jovens…) para que tudo estivesse impecável na noite de Santo António, dia oficial da abertura do arraial.
As expectativas confirmavam-se amplamente. No recinto, havia uma oferta infindável de divertimentos: barracas de jogos de setas, com o intuito de acertar em várias cartas coladas no enorme placard de cortiça; argolas para enfiar nos gargalos das garrafas de vinho do Porto, bolas de trapo para derrubarem as latas…
As tendas das quermesses com as suas gambiarras de lâmpadas coloridas, festões e bandeiras, proporcionavam um belíssimo aspecto ao local. O recinto de baile, cuidadosamente decorado de festões e luz a jorros, era o centro de atracção do magnífico local com vista sobre o Tejo.
Por sobre isto, havia arranjos meticulosos e sempre com jeito educativo, tronos dos Santos Populares, aos quais o Padre Correia da Cunha nunca se esquecia de juntar o do seu devoto Santo Padroeiro de Lisboa, São Vicente.
Como era possível alcançar-se todo este panorama decorativo? Sem dúvida devido ao bom gosto do Padre Correia da Cunha que todos os anos não se cansava de pedir ao vereador do pelouro da Câmara Municipal de Lisboa, a cedência dos mastros de bandeira, casinhotas decorativas, vasos de verduras ornamentais e outros equipamentos para a logística do evento.
 
 
Recordo que o Padre Correia da Cunha convidava para este arraial altas individualidades da vida nacional, que se faziam acompanhar das suas esposas e aquém ele oferecia sempre um vaso de manjerico com os tradicionais cravos de papel. Quase sempre em troca, recebia um donativo para as obras caritativas da Paróquia.
Outro aspecto fundamental do recinto era a banca dos comes e bebes com as comidas típicas da época assim como a boa música portuguesa que animava todo aquele enorme espaço.

 
 




As rainhas da festa eram a sardinha fresca e a febra saborosa acompanhada do vinho seleccionado, cujas qualidades o Padre Correia da Cunha tanto gostava de enaltecer. Para estas noites de folia, o Padre Correia da Cunha aconselhava-se com o deus Baco que lhe recomendava um néctar de cor carregada, que na gíria se dava pelo nome de carrascão, mas como ele referia sem baptismo (sem mistura de água).

As sardinhas assadas quentinhas e loirinhas, acompanhadas de uma boa salada de tomate, alface, pepino e pimento e muita cebola, eram a justificação para se repetirem as muitas rodadas do bom vinho servido em canjirões de barro.

 

A título de curiosidade histórica relembro que nos primeiros tempos da Monarquia, o preço do vinho em Lisboa era posto em «Assembleia dos Homens bons do Concelho», presidida pelo prior de São Vicente de Fora.

O Padre Correia da Cunha era um bom amigo dos seus paroquianos e da sua amada Lisboa pelo que valorizava as Festas dos Santos Populares e todos os anos organizava naquele ameno local aquele fantástico arraial.

 




Não arrefecerá tão cedo a memória deste alfacinha, marinheiro, simples, dedicado, culto e infatigável que foi este prior de São Vicente de Fora e soube fazer ao seu modo, subjugado pela magia que a cidade que o viu nascer, lhe havia marcado na sua alma de Lisboeta.

Lisboa e o bairro de São Vicente de Fora precisarão sempre de homens que em toda a sua simplicidade exaltem estas tradições impregnadas de grande sensibilidade e que o povo adora participar activamente. Sim, porque o povo idolatra as festas dos seus Santos Populares: Santo António, São João, São Pedro e São Vicente.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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