.
.
.
(No lado sul do patamar superior. Mesa e duas cadeiras.)
Dono (Consultando o relógio):
É meia-noite, e não posso ir à deita…
A mulher:
Mas está o sono à espreita!
…………………………
As portas estão trancadas?
Dono:
Tão!
A mulher:
E as janelas também estão fechadas?
Dono:
Tão! E já dorme tudo a bom dormir…
A mulher:
Então, marido, temos também de ir…
Dono:
Não! Não! Quero contar ainda o meu dinheiro!
(Põe-se a contar, feliz…)
A mulher (de repente e assustada):
Ó querido, não estás a ouvir passos?
Dono (indiferente):
Não!
A mulher:
Mas eu ouço, eu ouço!...
Dono:
Ó filha, assim não posso
Fazer as minhas contas!...
Não me venhas causar mais embaraços!
Ai as mulheres são cabecinhas tontas!
…………………………………………
…………………………………………
Mas escuta… Vai ver!
Vai aí ao postigo ver quem é.
A mulher:
Ainda mal se enxerga; mal se vê.
Mas quer-me a mim par’cer
Que é gentinha pelintra. Espera!
‘Stão a modos cansados da viagem…
Abrigaram-se além, no muro da Hera…
Dono:
Se para cá vierem, na Estalagem
Não há lugar! Se forem maltrapilhos.
Não estamos p’ra sarilhos!
Vão p’ros acampamentos dos ciganos!
… Mas não virão! Senão, deixa-os comigo!...
………………………………………………
Ouve agora, Mulher, ouve o que digo:
- Eu trago cá uns planos…
Fizemos desta vez um dinheirão.
Já estive a ver. Ganhámos muito bem…
E assim p’ró ano, isto será Pensão
Ou mesmo Hotel… Hein! Tas a ver, Mulher?!
GRANDE HOTEL DE BELÉM!...
E eu grande senhor… Tas bem a ver?!
…Um PALACE HOTEL!...
Até o nosso Primo Samuel
Se morderá de inveja, quando vir…
A mulher:
E a Prima Sara?!...Muito me hei-de eu rir!...
Dono:
Amanhã, irei até à cidade
Comprar uma mobília nova e rica:
Mesas, cadeiras, camas… Tudo em tola
E os tampos de formica!
A mulher:
E para mim? Ah! Compra-me uma ‘stola
De peles argentês!
Dono:
Se não for muito caro… Sim talvez.
…………………………………….
E também quero louça de pirex
P’ra mesa e p’ra cozinha…
A mulher:
Mas não esqueças a tua mulherzinha!...
Vai-me trazer, de certo, um bom colar
E um fato de lastex,
P’ra quando eu for à praia passear…
E uns brincos de brilhantes
E uns broches elegantes,
Meias de nylon e chapéu à moda
(Ai que a Sarinha vai morder-se toda!...)
Ah! Não te esqueças de um perfume raro,
Da marca Helena Rubistai
Ou da Marcela Rocha… Não é caro…
Dono:
Pois não, não é! Ai! Ai!...
Nessa não cai o filho do meu pai!
Tu julgarás que eu vou daí abaixo?
Qu’eu ‘stou maluco ou que ando já borracho?
……………………………………………….
Não temos de poupar…
……………………………………………….
… Trago-te um avental e a prestações…
Ou tu não vês que temos de pensar
Nas tais instalações?...
… Pois mesmo todo aquele material
(Mesas, cadeiras, etccetra e tal…)
É porque tem de ser, p’ra chamariz
De mais clientela e freguesia…
…Gastar dinheiro assim, dessa maneira?...
Não!... Não! Fica sabendo: eu antes queria
Ver a arrancada a dentadura inteira!
A mulher:
Meu Deus! Meu Deus! Como eu sou infeliz!...
Já não gostas de mim! Não há direito!...
Nem um broche sequer p’ra pôr ao peito…
P’ra ti… só como escrava de trabalho,
E nada mais!
Ai que vida tão triste!...
(chora)
Dono:
E pronto! São assim cabeças tontas
Estas mulheres não sabem fazer contas!
………………………………………….
…………………………………………..
A mulher:
Parece que bateram… Não ouviste?
Dono:
Querem ver que são eles?! – Não levam nada!
………………………………………………
- Que querem vossemecês?
Voz de S. José:
Ó meu Senhor, venho pedir pousada,
Ao menos para a minha mulherzinha,
Que está no nono mês…
Dono:
Olhem, não vá nascer a criancinha!...
Aqui não há lugar! Pois vão bater
Aí a outras portas…
Voz de S. José:
A estas horas mortas?...
Não é possível, não, ó meu Senhor!
Dono:
Isso não é comigo!...
Voz de S. José:
Por caridade, Amigo!...
Tenha dó por favor…
Dono:
Qual caridade, ou quê!... Qual carapuça!
Ponham-se a andar! Ao largo! Toca a andar!
(À mulher:)
Or’ouve lá! Trataste de fechar
Já o curral da mossa mula ruça?
A mulher (indiferente)
Sim fechei. Porquê?
Dono:
È que esta gente…Percebes?...Bem se vê…
Bem! Vamos nós à vida!
……………………………………………
E esta hein?! Esta agora! … Dar guarida
A gente maltrapilha!
Ora esta!... – Vamos, Filha!
………………………………………….
Olá!... Que cisma é essa?
A mulher:
Não tens nada com isso. É cá comigo!
Dono:
Mas, ó mulher!...
A mulher:
Não sei! Não sei! Não digo!
Dono:
Mas tu não ‘tarás boa da cabeça,
O quê? Cheira-me a esturro!...
Perdeste o piu, ó minha tagarela?
A mulher:
É que inda há pouco tu foste tão casmurro!
…………………………………………….
Voz de S. José:
Ó boa gente! … Tenham pena dela…
‘Stá prestes a ser Mãe…
Minha boa senhora, tenha dó de quem…
A mulher:
Oh! Homenzinho! Vá-se lá embora!
Aqui não há lugar!...
Dono:
Já disse. Toca a andar!
Ou é preciso ir chamar a guarda?
Voz de MARIA:
Bom Senhor… Tenha compaixão!...
Chegou a minha hora; Já não tarda…
Mulher (em aparte para o marido):
…Que voz tão doce!...
Parece que me corta o coração…
Dono:
Mulher, inda se fosse
Gentinha com dinheiro… Mas assim…
Voz de MARIA:
Boa Senhora, tenha dó de mim!
Cá fora sopra rija tempestade.
A noite é um horror!...
Por Deus lhe peço: Faça-me o favor!...
A mulher (em aparte para o marido):
Não sei que hei-de fazer…
Dono:
Já disse! Não abras!
A mulher:
Mas realmente… A noite, o frio, o vento…
Dono:
Que fiquem ao relento
Ou no curral das cabras!
A mulher:
Mas ouve, Filho: E se o Bebé nascer
Lá na rua…De certo, morreria
Com uma noite assim. Que horror!
Ora vê bem… Vê lá…Não é melhor
A gente receber…
Dono:
Não te deixes levar por pieguices!
Não lhe abras a porta. Já ‘tá dito!
E nada de tolices!...
A mulher:
Ó filho!...Mas a noite, a tempestade…
A chuva… a ventania…
Eu sinto o coração aflito…
E o frio?... Não seria
Muito melhor usar de caridade?
…E dar pousada aos pobres peregrinos,
Como a ‘Scritura reza
Em preceitos divinos?...
…Dar-lhes também do pão da nossa mesa…
…Dar-lhes um pouco de café quentinho…
E sentá-los ali, junto à lareira…
E dar-lhes, pelo menos, uma esteira,
Ali, naquele cantinho,
Onde a Senhora, em paz pudesse ter
O Menino que está para nascer?
(chorando)
Já que eu não quis ter nunca essa alegria,
Podia ser que este bebé, um dia
Fosse para nós um filho muito querido…
(chora)
…………………………………………….
…………………………………………….
Narrador:
… Lá fora, continua a tempestade…
… Onde é que eles andarão?...
A mulher (sai à procura dos peregrinos, chorando):
Meu pobre coração sem caridade,
Meu pobre coração,
Também tu estás perdido!...
………………………………………………….
………………………………………………….
Narrador:
Com a alma ardendo em fogo e os olhos rasos de água,
Levando no seu peito uma profunda mágoa,
Esta pobre mulher não se contém…
Corre os caminhos todos de Belém,
A procurar o coração perdido…
………………………………………………………
………………………………………………………
A mulher: (já no meio do patamar superior, chorando):
? Onde é que está aquela voz tão doce?...
? Onde a Senhora que ia dar à luz?...
? Onde meu coração estará escondido?...
…………………………………………………..
………………………………………………….
Narrador:
…E viu raiar no Céu a luz da Esperança!
A mulher:
… OH! Quem me dera que esta luz lá fosse!
………………………………………………
Narrador:
… E viu na manjedoura uma criança,
Olhar todo PERDÃO…. ERA JESUS!
(Entretanto, sinos e órgão começam, pianíssimo e depois num crescendo contínuo, variações sobre o tema do ADESTE FIDELES.)
Narrador:
E é sempre assim, IRMÃOS, assim, tal qual…
Que o Senhor tem na Terra o seu NATAL.
Não finda aqui mistério tão profundo,
Mas continua pela vida fora,
Até ao fim do mundo.
Busca Deus sempre uma alma onde nascer…
Mas quase toda a gente o manda embora,
E só poucos o querem receber…
……………………………………………..
Mas tu, IRMÃO, faz como a pecadora;
- Abre-te a DEUS que em ti quer vir morar
E dar-te a salvação…
Talvez que ELE bata à tua porta agora…
Transforma num presépio o coração!
Teu coração transforma num ALTAR!...
(Órgão, sinos e coros: ADESTE FIDELES.)
LAUS DEO
VIRGINIQUE MARIAE
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ACOLHER É UM DESAFIO PARA A COMUNIDADE CRISTÃ
O Padre Correia da Cunha era muito autónomo no seu múnus sacerdotal. Nunca requereu coadjutor para a sua Paróquia. Nas precárias instalações que dispunha, para se alojar e alojar os que lhe solicitavam acolhimento, nunca lhe vi recusar pousada. À semelhança de Jesus, acolhia sobretudo aqueles mais frágeis e afastados por motivos de atitude ou livre pensamento…
Hoje recordo:
Rev. Padre José Mitchel: clérigo da Igreja Católica Bizantina que tão bem se integrou na Comunidade Paroquial. Prestou um excelente serviço na Pastoral Juvenil. Para todos aqueles que tiveram o privilégio de conhecê-lo mais de perto - era amoroso, bondoso e inesquecível amigo, e especificamente para nós – um grande exemplo de verdadeiro cristão.
Padre José Diogo d’Orey Mousinho de Albuquerque de Mascarenhas Gaivão (1934-1980) : aquele que almejava os valores da liberdade política e neles se empenhava com graves sacrifícios para a sua vida no serviço aos oprimidos pelo regime então vigente. Brilhante professor de Religião e Moral no Colégio Valsassina de Lisboa, que era uma referência de excelência do ensino particular em Portugal, já no período anterior ao 25 de Abril.
Padre Ismael Sanches OBS: padre religioso e grande intelectual com fortes ligações à Juventude Universitária Católica e ao ensino, com posições teológicas que valorizavam os direitos humanos e as transformações sociais.
…
Estes são apenas alguns dos muitos que Padre Correia da Cunha acolheu na sua Pousada Paroquial de São Vicente de Fora.
Padre Correia da Cunha preocupava-se e comprometia-se com aqueles que precisavam de apoio e de serem cativados. Padre Correia da Cunha sempre pensou pela sua própria cabeça e nunca prestou vassalagem fosse a quem fosse. Só se submetia aos favores de Deus e ao seu auxílio.
A Paróquia de São Vicente de Fora serviu de pousada a muitos mais… porque Padre Correia da Cunha, por seu próprio temperamento e por todas as suas profundas convicções, deveria ser sempre aquele pastor, de coração aberto, que acolhia todas as pessoas independentemente da sua situação. Não se preocupava com as severas criticas que lhe poderiam ser apontadas e sempre o fez sem consultar os seus superiores.
Na verdade o amor para ele era assim!
Hoje recordo:
Rev. Padre José Mitchel: clérigo da Igreja Católica Bizantina que tão bem se integrou na Comunidade Paroquial. Prestou um excelente serviço na Pastoral Juvenil. Para todos aqueles que tiveram o privilégio de conhecê-lo mais de perto - era amoroso, bondoso e inesquecível amigo, e especificamente para nós – um grande exemplo de verdadeiro cristão.
Padre José Diogo d’Orey Mousinho de Albuquerque de Mascarenhas Gaivão (1934-1980) : aquele que almejava os valores da liberdade política e neles se empenhava com graves sacrifícios para a sua vida no serviço aos oprimidos pelo regime então vigente. Brilhante professor de Religião e Moral no Colégio Valsassina de Lisboa, que era uma referência de excelência do ensino particular em Portugal, já no período anterior ao 25 de Abril.
Padre Ismael Sanches OBS: padre religioso e grande intelectual com fortes ligações à Juventude Universitária Católica e ao ensino, com posições teológicas que valorizavam os direitos humanos e as transformações sociais.
…
Estes são apenas alguns dos muitos que Padre Correia da Cunha acolheu na sua Pousada Paroquial de São Vicente de Fora.
Padre Correia da Cunha preocupava-se e comprometia-se com aqueles que precisavam de apoio e de serem cativados. Padre Correia da Cunha sempre pensou pela sua própria cabeça e nunca prestou vassalagem fosse a quem fosse. Só se submetia aos favores de Deus e ao seu auxílio.
A Paróquia de São Vicente de Fora serviu de pousada a muitos mais… porque Padre Correia da Cunha, por seu próprio temperamento e por todas as suas profundas convicções, deveria ser sempre aquele pastor, de coração aberto, que acolhia todas as pessoas independentemente da sua situação. Não se preocupava com as severas criticas que lhe poderiam ser apontadas e sempre o fez sem consultar os seus superiores.
Na verdade o amor para ele era assim!
A POUSADA
(No lado sul do patamar superior. Mesa e duas cadeiras.)
Dono (Consultando o relógio):
É meia-noite, e não posso ir à deita…
A mulher:
Mas está o sono à espreita!
…………………………
As portas estão trancadas?
Dono:
Tão!
A mulher:
E as janelas também estão fechadas?
Dono:
Tão! E já dorme tudo a bom dormir…
A mulher:
Então, marido, temos também de ir…
Dono:
Não! Não! Quero contar ainda o meu dinheiro!
(Põe-se a contar, feliz…)
A mulher (de repente e assustada):
Ó querido, não estás a ouvir passos?
Dono (indiferente):
Não!
A mulher:
Mas eu ouço, eu ouço!...
Dono:
Ó filha, assim não posso
Fazer as minhas contas!...
Não me venhas causar mais embaraços!
Ai as mulheres são cabecinhas tontas!
…………………………………………
…………………………………………
Mas escuta… Vai ver!
Vai aí ao postigo ver quem é.
A mulher:
Ainda mal se enxerga; mal se vê.
Mas quer-me a mim par’cer
Que é gentinha pelintra. Espera!
‘Stão a modos cansados da viagem…
Abrigaram-se além, no muro da Hera…
Dono:
Se para cá vierem, na Estalagem
Não há lugar! Se forem maltrapilhos.
Não estamos p’ra sarilhos!
Vão p’ros acampamentos dos ciganos!
… Mas não virão! Senão, deixa-os comigo!...
………………………………………………
Ouve agora, Mulher, ouve o que digo:
- Eu trago cá uns planos…
Fizemos desta vez um dinheirão.
Já estive a ver. Ganhámos muito bem…
E assim p’ró ano, isto será Pensão
Ou mesmo Hotel… Hein! Tas a ver, Mulher?!
GRANDE HOTEL DE BELÉM!...
E eu grande senhor… Tas bem a ver?!
…Um PALACE HOTEL!...
Até o nosso Primo Samuel
Se morderá de inveja, quando vir…
A mulher:
E a Prima Sara?!...Muito me hei-de eu rir!...
Dono:
Amanhã, irei até à cidade
Comprar uma mobília nova e rica:
Mesas, cadeiras, camas… Tudo em tola
E os tampos de formica!
A mulher:
E para mim? Ah! Compra-me uma ‘stola
De peles argentês!
Dono:
Se não for muito caro… Sim talvez.
…………………………………….
E também quero louça de pirex
P’ra mesa e p’ra cozinha…
A mulher:
Mas não esqueças a tua mulherzinha!...
Vai-me trazer, de certo, um bom colar
E um fato de lastex,
P’ra quando eu for à praia passear…
E uns brincos de brilhantes
E uns broches elegantes,
Meias de nylon e chapéu à moda
(Ai que a Sarinha vai morder-se toda!...)
Ah! Não te esqueças de um perfume raro,
Da marca Helena Rubistai
Ou da Marcela Rocha… Não é caro…
Dono:
Pois não, não é! Ai! Ai!...
Nessa não cai o filho do meu pai!
Tu julgarás que eu vou daí abaixo?
Qu’eu ‘stou maluco ou que ando já borracho?
……………………………………………….
Não temos de poupar…
……………………………………………….
… Trago-te um avental e a prestações…
Ou tu não vês que temos de pensar
Nas tais instalações?...
… Pois mesmo todo aquele material
(Mesas, cadeiras, etccetra e tal…)
É porque tem de ser, p’ra chamariz
De mais clientela e freguesia…
…Gastar dinheiro assim, dessa maneira?...
Não!... Não! Fica sabendo: eu antes queria
Ver a arrancada a dentadura inteira!
A mulher:
Meu Deus! Meu Deus! Como eu sou infeliz!...
Já não gostas de mim! Não há direito!...
Nem um broche sequer p’ra pôr ao peito…
P’ra ti… só como escrava de trabalho,
E nada mais!
Ai que vida tão triste!...
(chora)
Dono:
E pronto! São assim cabeças tontas
Estas mulheres não sabem fazer contas!
………………………………………….
…………………………………………..
A mulher:
Parece que bateram… Não ouviste?
Dono:
Querem ver que são eles?! – Não levam nada!
………………………………………………
- Que querem vossemecês?
Voz de S. José:
Ó meu Senhor, venho pedir pousada,
Ao menos para a minha mulherzinha,
Que está no nono mês…
Dono:
Olhem, não vá nascer a criancinha!...
Aqui não há lugar! Pois vão bater
Aí a outras portas…
Voz de S. José:
A estas horas mortas?...
Não é possível, não, ó meu Senhor!
Dono:
Isso não é comigo!...
Voz de S. José:
Por caridade, Amigo!...
Tenha dó por favor…
Dono:
Qual caridade, ou quê!... Qual carapuça!
Ponham-se a andar! Ao largo! Toca a andar!
(À mulher:)
Or’ouve lá! Trataste de fechar
Já o curral da mossa mula ruça?
A mulher (indiferente)
Sim fechei. Porquê?
Dono:
È que esta gente…Percebes?...Bem se vê…
Bem! Vamos nós à vida!
……………………………………………
E esta hein?! Esta agora! … Dar guarida
A gente maltrapilha!
Ora esta!... – Vamos, Filha!
………………………………………….
Olá!... Que cisma é essa?
A mulher:
Não tens nada com isso. É cá comigo!
Dono:
Mas, ó mulher!...
A mulher:
Não sei! Não sei! Não digo!
Dono:
Mas tu não ‘tarás boa da cabeça,
O quê? Cheira-me a esturro!...
Perdeste o piu, ó minha tagarela?
A mulher:
É que inda há pouco tu foste tão casmurro!
…………………………………………….
Voz de S. José:
Ó boa gente! … Tenham pena dela…
‘Stá prestes a ser Mãe…
Minha boa senhora, tenha dó de quem…
A mulher:
Oh! Homenzinho! Vá-se lá embora!
Aqui não há lugar!...
Dono:
Já disse. Toca a andar!
Ou é preciso ir chamar a guarda?
Voz de MARIA:
Bom Senhor… Tenha compaixão!...
Chegou a minha hora; Já não tarda…
Mulher (em aparte para o marido):
…Que voz tão doce!...
Parece que me corta o coração…
Dono:
Mulher, inda se fosse
Gentinha com dinheiro… Mas assim…
Voz de MARIA:
Boa Senhora, tenha dó de mim!
Cá fora sopra rija tempestade.
A noite é um horror!...
Por Deus lhe peço: Faça-me o favor!...
A mulher (em aparte para o marido):
Não sei que hei-de fazer…
Dono:
Já disse! Não abras!
A mulher:
Mas realmente… A noite, o frio, o vento…
Dono:
Que fiquem ao relento
Ou no curral das cabras!
A mulher:
Mas ouve, Filho: E se o Bebé nascer
Lá na rua…De certo, morreria
Com uma noite assim. Que horror!
Ora vê bem… Vê lá…Não é melhor
A gente receber…
Dono:
Não te deixes levar por pieguices!
Não lhe abras a porta. Já ‘tá dito!
E nada de tolices!...
A mulher:
Ó filho!...Mas a noite, a tempestade…
A chuva… a ventania…
Eu sinto o coração aflito…
E o frio?... Não seria
Muito melhor usar de caridade?
…E dar pousada aos pobres peregrinos,
Como a ‘Scritura reza
Em preceitos divinos?...
…Dar-lhes também do pão da nossa mesa…
…Dar-lhes um pouco de café quentinho…
E sentá-los ali, junto à lareira…
E dar-lhes, pelo menos, uma esteira,
Ali, naquele cantinho,
Onde a Senhora, em paz pudesse ter
O Menino que está para nascer?
(chorando)
Já que eu não quis ter nunca essa alegria,
Podia ser que este bebé, um dia
Fosse para nós um filho muito querido…
(chora)
…………………………………………….
…………………………………………….
Narrador:
… Lá fora, continua a tempestade…
… Onde é que eles andarão?...
A mulher (sai à procura dos peregrinos, chorando):
Meu pobre coração sem caridade,
Meu pobre coração,
Também tu estás perdido!...
………………………………………………….
………………………………………………….
Narrador:
Com a alma ardendo em fogo e os olhos rasos de água,
Levando no seu peito uma profunda mágoa,
Esta pobre mulher não se contém…
Corre os caminhos todos de Belém,
A procurar o coração perdido…
………………………………………………………
………………………………………………………
A mulher: (já no meio do patamar superior, chorando):
? Onde é que está aquela voz tão doce?...
? Onde a Senhora que ia dar à luz?...
? Onde meu coração estará escondido?...
…………………………………………………..
………………………………………………….
Narrador:
…E viu raiar no Céu a luz da Esperança!
A mulher:
… OH! Quem me dera que esta luz lá fosse!
………………………………………………
Narrador:
… E viu na manjedoura uma criança,
Olhar todo PERDÃO…. ERA JESUS!
(Entretanto, sinos e órgão começam, pianíssimo e depois num crescendo contínuo, variações sobre o tema do ADESTE FIDELES.)
Narrador:
E é sempre assim, IRMÃOS, assim, tal qual…
Que o Senhor tem na Terra o seu NATAL.
Não finda aqui mistério tão profundo,
Mas continua pela vida fora,
Até ao fim do mundo.
Busca Deus sempre uma alma onde nascer…
Mas quase toda a gente o manda embora,
E só poucos o querem receber…
……………………………………………..
Mas tu, IRMÃO, faz como a pecadora;
- Abre-te a DEUS que em ti quer vir morar
E dar-te a salvação…
Talvez que ELE bata à tua porta agora…
Transforma num presépio o coração!
Teu coração transforma num ALTAR!...
(Órgão, sinos e coros: ADESTE FIDELES.)
LAUS DEO
VIRGINIQUE MARIAE
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muito bom principalmente nós que gostamos estudar, religião e paganiso.
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