.
.
.
“A geometria, pelas suas mãos, perdia toda a beleza
das matérias insondáveis. Esta ciência, afinal, penetra todo o mundo em que
vivemos.”
Com este meu modesto
escrito pretendo revelar-vos uma pequena história sobre o exame de geometria do
Reverendo Correia da Cunha. Se desfocada, peço desde já as minhas desculpas.
Nunca lhe ouvi falar
desta disciplina, certamente porque devia estar de boa saúde, a desgraçadinha!
Segundo o seu
condiscípulo Padre Teodoro Marques da Silva, o Correia da Cunha era um
brilhante estudante com elevadas classificações em todas as cadeiras. Só o
sentiu aflito e com algumas dificuldades na maldita geometria, onde aplicava
todos os esforços para o não fazer passar por vergonhas no exame.
Naqueles tempos, o exame
de geometria era assistido por um júri composto de um docente catedrático de
matemática, que era o presidente, e dois professores da arte.
Naquele “maldito” dia, à
hora marcada, lá estava reunido sobre o estrado da sala de exames do Seminário
dos Olivais, o júri trajando as solenes togas negras.
Feita a chamada dos
candidatos, os examinandos deveriam escrever num livro que estava sobre a mesa
do júri, o seu nome, naturalidade e filiação.
Acabada esta inscrição,
o primeiro na ordem da pauta era chamado para prestação da prova oral de
geometria. Eram concedidos trinta minutos, marcados por ampulheta.
Chegada a hora, o jovem
Correia da Cunha lá subiu ao tablado, onde se encontrava a enorme lousa negra
para expressar os seus refulgentes raciocínios, sem contudo se deixar de
preocupar com a operação mecanizada das areias da “bendita” ampulheta.
Pede-lhe o Presidente do
Júri que desenhe um polígono.
De imediato, mas com a
tranquilidade que o caracterizava, o Correia da Cunha foi para a ponta da lousa
e passado algum tempo o quadro estava cheio de linhas. Umas numa direcção,
outras noutras, umas mais carregadas, outras mais leves, umas mais fáceis,
outras mais custosas…
Os jurados estavam
estupefactos com o que observavam, sendo o presidente do júri obrigado a
interrogá-lo sobre todas aquelas linhas. Correia da Cunha naquele exacto
momento dirigiu-se ao presidente e expressou:
- Com o devido respeito,
informo que V.Exª não indicou o número de lados.
Perante esta resposta só
restou aos mestres gravarem a enorme arte e sabedoria deste jovem examinando, tendo-lhe
sido pedido então que desenhasse um triângulo.
O jovem seminarista
Correia da Cunha aprendia depressa: algumas questões não tinham segredos para
ele.
O Mistério da Trindade
era representado com um triângulo. Era indício de um bom prenúncio.
Após a definição de
Geometria, como a ciência que tem por objectivo a medida indirecta da extensão…
A concepção de corpos geométricos força ao espírito a ideia de superfície, e
este a ideia de linha, esta finalmente, a de ponto. O ponto é o elemento
geométrico irredutível. A superfície é o limite do corpo geométrico, a linha é
o limite da superfície.
Foi-lhe então perguntado
o teorema da soma dos ângulos internos de um triângulo, que enunciou
correctamente mas com a seguinte anotação: “ a demostração é defeituosa porque
lança mão de quantidades infinitas, comparando-as com quantidades finitas”.
Na verdade com aquele
pequeno estratagema das linhas, o tempo marcado pela ampulheta já estava
definitivamente ultrapassado pelo que se teve de dar como terminada a prova
oral de geometria do jovem seminarista.
Os membros do júri executam
o juízo do exame e procedem à classificação do examinado. O resultado da nota
foi cuidadosamente lançado no livro pelo secretário: 17 valores.
Como sabemos o Padre
Correia da Cunha era mais um filósofo que um cientista, concluíra a sua
formação imensamente satisfeito com a educação recebida no seu Seminário e
afirmava que graças a essa educação ali recebida, lhe foram proporcionadas
muitas respostas para as difíceis e importantes interrogações que a vida lhe
foi colocando ao longo da vida.
O Padre Correia da Cunha
acreditava que possuía dotes naturais mas a profunda fé, a crença na simbologia
da Trindade terão contribuído muito mais para o final feliz do seu exame de
geometria.
A sua modéstia não lhe
permitia atribuir a si próprio as inspirações de uma nata sabedoria, mas sim a
todos os seus grandes mestres que o acompanharam ao longo do seu percurso na
naquela casa, que ele continuava a considerar sua.
Aproveito para uma vez
mais recordar a figura de Mons. Pereira dos Reis, que deixou marcas indeléveis
no coração de Padre Correia da Cunha que sempre o recordava como UM GRANDE
HOMEM DA IGREJA.
.
.
.
.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário