quinta-feira, 13 de setembro de 2012

PE. CORREIA DA CUNHA E O MOSTEIRO S. VICENTE DE FORA


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PE CORREIA DA CUNHA E CORVO VICENTE



Naqueles espaços delicados e abertos conseguia ingressar nos mais profundos sentimentos e reflexões… E assim o fez ao longo da vida para chegar a Deus e aos irmãos!






É impossível pensar sobre o Mosteiro de São Vicente de Fora sem reflectir sobre o Padre Correia da Cunha. A chegada, nos anos quarenta, deste jovem padre de cultura e amante das artes, ao abandonado mosteiro dos frades regrantes de Santo Agostinho apresentou-se como uma indelével e eterna paixão. A arte expressa nos seus belos azulejos era uma bênção para ele que duraria até ao dia do seu último suspiro. Estes encantadores espaços do Mosteiro de São Vicente de Fora foram a sua vida.

O primeiro espaço, do descomunal mosteiro, ocupado pelo então jovem capelão da Armada Portuguesa foi um quarto contíguo à nobre Sala da Portaria cedido pelo velhinho pároco, Mons. Francisco Esteves (1871/1959). VER FOTO.





Foi neste pequeno espaço que vivera os seus primeiros sonhos e emoções que ficariam inscritos nas pedras e nos painéis de azulejos. Foi da intimidade deste seu quarto que partiria para a descoberta de todos aqueles amplos e esplendorosos espaços que albergavam ainda algumas repartições administrativas do Estado assim como longos corredores e salas deixados vazios pelo Liceu Central de Gil Vicente, que foi ali criado em 1914*.

* A actual Escola Secundária de Gil Vicente, anterior Liceu Nacional de Gil Vicente, nasce como uma secção oriental do Liceu Passos Manuel, tornando-se autónomo em 1915, sendo o primeiro liceu de Lisboa criado após a República. O mesmo funcionou no Mosteiro de São Vicente de Fora até 1949, ano em que, na antiga cerca deste mosteiro foram inauguradas as actuais instalações.



Com a nomeação do Padre Correia da Cunha, no ano de 1960, para pároco de São Vicente de Fora, este decidiu instalar a sua residência paroquial nos amplos espaços dos claustros, ocupando um salão que transformou em quarto e duas amplas salas para área de trabalho e para construir momentos de relação com os seus paroquianos.


Das muitas janelas que dispunham as salas da residência paroquial, podia apenas observar as muitas miseráveis barracas existentes no enorme pátio anexo ao Mosteiro.

Foi por pressão sua que a Fundação Cardeal Cerejeira, criada no ano de 1957, por ocasião do jubileu académico do Dr. Manuel Gonçalves Cerejeira, veria a solucionar este degradante cenário com a construção de casas para essas famílias carenciadas no bairro de Santa Maria dos Olivais.


O Padre Correia da Cunha era uma pessoa de riscos e jamais desistiria de nortear a sua vida pelos valores e princípios em que confiava.

Rigoroso e ético mantinha-se fiel à sua filosofia de vida: aquele degradante e miserável cenário não o deixava dormir tranquilamente, pelo que permanentemente fazia eco desta sua amargura junto do Cardeal Cerejeira, que o adorava e tinha uma imensa afeição paternal pelo jovem padre. Um dia teve conhecimento que o Cardeal Patriarca de Lisboa se engajou e se comprometeu na resolução desta questão de elementar justiça, transformando o Evangelho em acção.




Com a saída do antigo sacristão, Sr. Manuel, o Padre Correia da Cunha se instalou no primeiro piso do Mosteiro, no espaço ocupado por este colaborador desde os tempos do seu antecessor. Estes aposentos eram finalmente sentidos como o seu abrigo de descanso e permitiam ao Padre Correia da Cunha gozar da possibilidade de avistar toda a bela paisagem sobre a colina do Castelo de São Jorge.





Só mais tarde, com a colaboração das OGFE, projectou e construiu a sua residência no topo do edifício, onde podia cultivar o seu espírito, com esplêndidas vistas sobre todo o Estuário do Tejo e as colinas da sua amada Lisboa.





Segundo as palavras dos seus médicos, o Padre Correia da Cunha precisava de sol, de forma a suavizar o sofrimento da sua dolorosa doença reumática. Naquele imenso terraço orientado para o pôr-do-sol, onde dispunha de espreguiçadeiras para os seus banhos de sol, lembro-me de indescritíveis experiências e momentos de prazer, paz e liberdade, tomando umas cervejas fresquinhas, entre amigos, e olhando aqueles cenários deslumbrantes.





Será difícil não recordar esses momentos de convívio com um homem de grande envergadura, que não se compadecia com meias tintas. Afirmava tudo o que pensava com admirável precisão. Por isso hoje é amado mas também odiado por aqueles cujo os vícios são opostos a tais virtudes. Uma coisa, asseguro: a sua linguagem era simples, clara, objectiva e sucinta, à boa maneira maruja.




Esta última residência do Padre Correia da Cunha era por ele descrita como a proa de um enorme navio, onde a sua alma suspensa podia alcançar todo o convés assim como um infindável horizonte para além Tejo. Era um precioso lugar para viver, trabalhar em paz e onde a alegria e a felicidade da companhia das imensas obras de arte que coleccionou ao longo da vida, lhe enchiam o coração e o espírito. Mas havia naquele lugar um espaço especial e desejável. Uma enorme mesa de trabalho com um porta-retratos daquelas que amava e eram os verdadeiros encantos da sua vida…e todas as manhãs o cheiro do Alentejo chegava a Lisboa...





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