segunda-feira, 10 de abril de 2017

PE. CORREIA DA CUNHA - DESPEDIDA DO REI D.PEDRO IV











Armão Militar frente da Igreja de São Vicente de Fora




Foi precisamente há 45 anos, no dia 10 de Abril de 1972, ano do sesquicentenário da Independência do Brasil, que os restos mortais do Rei D. Pedro IV foram transladados do Panteão da Dinastia de Bragança, no Mosteiro de São Vicente de Fora, para serem sepultados na cripta do Monumento da Independência do Ipiranga, na cidade de São Paulo.



Urna com os restos mortais após exumação



Nesse dia 10  de Abril, a urna coberta de rico tecido de veludo roxo, com as armas reais portuguesa e brasileira, bordadas a ouro e com o monograma P (de Pedro)foi transportada por oito militares para o armão que se encontrava na frontaria da Igreja de São Vicente de Fora.





Embarque da Urna a Bordo do Paquete FUNCHAL(João Paulo Dias com a Cruz)



Durante o percurso da Igreja de São Vicente de Fora até ao Cais dos Soldados em Santa Apolónia observava-se um respeitoso silêncio das senhoras que acenavam lenços brancos e homens que se descobriam respeitosamente.



O armão militar estacionou ao início da rampa que dava acesso ao paquete Funchal. O transporte da urna para bordo foi efectuado por oito fuzileiros, das duas nacionalidades, tendo sido depositada no salão nobre em câmara ardente. Durante este curto trajecto foram ouvidas 21 salvas de tiros efectuadas pelas fragatas das respectivas armadas ali estacionadas.





Paquete Funchal no ano 1972


Só pelas 19 horas, o Paquete Funchal, com a comitiva presidencial a bordo, onde se incluía o Padre Correia da Cunha partiu do Cais de Alcântara com destino ao Rio de Janeiro. A viagem demoraria 12 dias. Chegou ao Rio de Janeiro no dia 22 de Abril, data simbólica da chegada de Pedro Alvares Cabral às Terras de Vera Cruz.

Durante a viagem a bordo do paquete Funchal foi publicado o jornal A ABITA. Excelente escolha do nome para um jornal de uma viagem marítima histórica. A abita é um gancho de ferro, maciço, que existe nas proas dos navios para amarração dos cabos. Era habitualmente o local onde o pessoal aproveitava para enviar mensagens e dar novidades ou formular críticas da vida a bordo.


O Padre Correia da Cunha foi convidado para colaborar jornalisticamente nesta publicação tão séria. Era o responsável pela coluna da poesia. Hoje publico dois poemas da sua autoria retirados do jornal A ABITA, jornal de maior tiragem e expansão a bordo do nosso transatlântico.




Chegada do Paquete Funchal ao Rio de Janeiro


ASSIM FOI…


Deus o quis! Deus o quis!
E as caravelas de Alvares Cabral
Vencendo os medos,
Do mar desventram míticos segredos
Fechados em portais de mil procelas.

Surge no Céu a Cruz feita de estrelas,
Em luz bordada por divinos dedos,
- Sinal de Bênção contra os maus enredos
Que lhe tecera o mar vendo-a nas velas.

E naquela manhã primaveril
- Manhã de criação! – nasce o Brasil
Um novo mundo surge em alvorada!
Sim! Deus o quis!... E em nossos corações
D’aquém e d’além mar reza Camões:
- Esta é a ditosa Pátria nossa Amada.


CINCO RIMAS EM CRUZEIRO


Com fio d’oiro em fundo azul
As nossas benditas quinas
Estão no Cruzeiro do Sul
Bordadas por mãos divinas.
Cinco estrelas em Cruzeiro,
Cinco chagas através:
…Meu Portugal brasileiro
É meu Brasil Português!...

Cinco chagas na bandeira
E cinco estrelas no céu
Definem na terra inteira
As Pátrias que Deus nos deu.

Deus o quis!... E foi por isto
- Por prémios de feitos mil
Que as cinco chagas de Cristo
Brilham nos Céus do Brasil.

Astros – Roteiro de Luz,
Quinas – de Bênção sinal
Para as Terras de Vera Cruz
Para as Terras de Portugal!

A bordo do paquete Funchal 18-19 Abril 1972





Havia também um espaço no jornal destinado a artigos das bisbilhotas da responsabilidade de Bera Lagunas.

O introito dessa secção iniciava-se assim: “Julgavam então que eu não vinha, a bordo? -Pois enganaram-se redondamente! Embarquei como passageira clandestina em Alcântara e viajo confortavelmente no porão da pompa, onde me chegam todas as novidades da primeira classe de luxo. Sim neste navio só há uma classe. O resto é mar.”


As notícias divulgadas nessa secção do jornal eram temperadas com algum molho humorístico. Transcrevo algumas notícias ali servidas sobre o Reverendo Padre Correia da Cunha.


“O Padre Correia da Cunha não quer aceitar o conselho de instalar «slott-machines» no Mosteiro de São Vicente de Fora, faz ferro… Ficamos sem saber como seria o « jack-pot».
Gostei de saber que o Padre Correia da Cunha baila bem o fandango e canta fado castiço, aprendido pelas vielas de Alfama.
Caso impar na história eclesiástica portuguesa: O Padre Correia da Cunha prior de São Vicente de Fora, prevendo há 20 anos que lhe iriam levar um paroquiano ilustre o Sr. D. Pedro (1º ou 4º conforme as latitudes) teve o cuidado de ir a Brest como Capelão da Marinha de Guerra, assegurar-se da entrada de outra paroquiana ilustre a Rainha D. Amélia de Orleães e Bragança “.



Quero terminar este texto, não à semelhança do Jornal da ABITA, que se deixou de publicar completados os 24 dias da viagem presidencial a terras de Vera Cruz, para dar a conhecer uma vasta colectânea de versos da autoria do Padre Correia da Cunha escritos a bordo do paquete Funchal em pleno Oceano Atlântico.







Na rota de Cabral…
Lusíadas
Gago Coutinho
Mar e Céu

Na rota de Cabral sulcando os mares
Com Sacadura e Coutinho
Seguimos hoje
Pela estrada do mar
Pela estrada que as Naus de mil quinhentos abriram
Parti nas caravelas de Cabral
Nos reinos de Neptuno abrindo estradas
É sonho? É realidade: - É
O céu e o mar apenas são luares
Na rota de Cabral, sulquei os mares
Rasgando estradas
Que nome te hei de eu dar
Ó meu : Ó velho Portugal
Ó terras do Brasil – rebento novo
Ó céus e mares, dois braços unidos
Esta é ditosa Pátria minha amada!

Os «Lusíadas» livro de orações
O mar e o céu
Eu sonho-me embarcado em caravelas
Talhadas de azul de sonho e de aventura
Embarquei nas frágeis caravelas
Fiz das ondas do mar elos d’amor
Vi nas estrelas do céu nossos faróis
Vencendo antigos nossos medos
Eu embarquei em frágeis caravelas
Venci antigos honrosos medos
Plantei no santuário dos segredos
Que Adamastor guardava com procelas.
Deus o quis!

No principio criou Deus céus e terra
Assim reza a palavra de escritos.
Deus o quis! E Cabral se fez ao mar
Com seus homens em frágeis caravelas
Rasgando estradas novas de encantar
Na selva horrenda de ondas em procelas
Nos corações um sonho de encantar
A Cruz de Cristo
Deus o quis! Embarquei nas caravelas!
Do profícuo mar fez pia de água benta
Para baptizar
Desde que Cabral sulcou os mares

Deus o quis! Deus o quis!...
E as caravelas de Alvares Cabral rasgaram estradas

PORTUGAL

Brasil e Portugal dois nomes são
Árvore antiga com rebento novo
Ou mãos  unidas como em oração
Brasil e Portugal apenas são:
Os nomes de baptismo dum só povo.

Cabral em suas frágeis caravelas
Fez das ondas do mar elos de amarra
Quando Cabral em frágeis caravelas
Fez das ondas do mar elos de amarra
E marcos de caminho das estrelas
A grata via Láctea da Saudade.

Sim! Deus o quis!  E as frágeis caravelas
De Alvares Cabral vencendo os medos
Desvendavam os míticos segredos
Fechados em portais de mil procelas.
O homem sonha e vê novas estrelas
Novos faróis.

Deus o quis! Deus o quis! E as caravelas
De Alvares Cabral, vencendo os medos
Do mar desvendam míticos segredos
Fechados em portais de mil procelas!

Surge no céu a cruz feita de estrelas
Como bordada por divinos dedos
Que bênção do Senhor conta os enviados
O Céu copia a cruz das nossas velas
Fúria que a manchava em pano de velas.


Surgem no céu a cruz feita de estrelas.
Em luz bordada por divinos dedos.
Sinal de bênção contra os maus enredos
Que lhe tecer o mar vendo-a nas velas.

E naquela manhã primaveril
Manhã de criação: nasce o Brasil
Um mundo novo ou uma nova alvorada
E um novo mundo surge do nada

Sim Deus o quis! E em todos corações
D’aquem e além-mar reza Camões:
Esta é a ditosa Pátria nossa Amada !

Árvore antiga com rebento novo
Ou mãos unidas como em oração
Brasil e Portugal apenas são
Os nomes de Baptismo dum só povo.

Deus o quis! Deus o quis! E as caravelas
De Álvares Cabral vencendo os medos
Desvendaram os míticos segredos
Fechados com portais de mil procelas.


Deus o quis! Deus o quis! E pendões velas
De frágeis barcas – infantis brinquedos
Deus o quis! Deus o quis! E terras belas surgem
Sim Deus o quis! Mais que uma visão unida.
No céu e mar a Cruz de Cristo
Sim Deus o quis!... E em nossos corações
Rezam baixinho a voz do Camões
Esta é a nossa ditosa Pátria muito amada.

BRASIL E PORTUGAL

Antigo tronco de raiz latina
Florindo em terras virgem do Brasil
A árvore Portugal de encanto mil
Cabral sulcando as águas do oceano
Fez das ondas do mar elos d’amarra
E dois aviadores
Uma só alma
Cabral sulcando os mares

A via láctea
Cinco luzinhas no céu
Retratam no céu azul
As quinas de Portugal
Por milagre um céu de anil
Louvamos Deus
Ó meu cruzeiro do Sul
Com cinco estrelas
As tuas estrelas de luz
As nossas benditas quinas
Estão em oiro sobre azul
Bordadas por mãos divinas
Como cruzeiro do Sul
Bordadas por mãos divinas
Com luz de oiro sobre azul?
Com luz de oiro vem céu

Cinco estrelinhas em Cruz
Cinco chagas num escudo
São a bênção de Jesus
O Brasil e Portugal
Não passam
Apenas consistem nisto
Em cinco estrelas no céu
Em cinco chagas de Cristo
Cinco estrelas em Cruzeiro
Cinco chagas a triavés
Meu Portugal, brasileiro
E meu Brasil português.

Jogar as cinco pedrinhas
No firmamento d’anil
Brilham no céu do Brasil
As quinas de Portugal

Duas Pátrias Deus nos deu
Por milagre nunca visto
Com brasão em terra e céu:
As cinco chagas de Cristo.

Cinco estrelinhas no céu
Cinco chagas na bandeira
Afirmam na terra inteira
As pátrias que Deus nos deu.

Com fio d’oiro em fundo azul
As nossas benditas quinas
Estão no Cruzeiro do Sul
Bordadas por mãos divinas.

Cinco estrelas em cruzeiro
Cinco chagas através:
É Portugal Brasileiro,
Que fez Brasileiro português?


Cinco chagas na bandeira,
Cinco estrelas no céu,
Definem na terra inteira
As Pátrias que Deus nos deu.

Deus o quis! E foi por isto,
Por prémio de feitos mil
Que as cinco chagas de Cristo
Brilham nos céus do Brasil.

Por tão divino sinal
Que nos deu o bom Jesus
O Brasil e Portugal
Terão sempre a mesma Cruz

A tão divino sinal
Juremos fidelidade
O Brasil e Portugal
Vivam fraterna amizade

Duas linhas uma Cruz
Uma bênção afinal
A terra de Vera Cruz
As terras de Potugal.

Estrelas roteiro de luz
Quinas de bênção sinal
As terras de Vera Cruz
As terras de Portugal

Lusa Via Láctea da saudade
Portugal ainda menino
Jogou com Deus as pedrinhas
Nas praias à beira-mar

Frondoso tronco de raiz latina
Floriu um dia em terras virginais
E revestiu-se
Fez das ondas do mar elos de amarra
Que liga e ata e une fortemente amarra
Uma com outras, estas nações irmãs
Até as ondas do mar
São elos fortes de amarra
E as estrelas do Céu, nossos faróis.

Não é desunião a independência
Aportam-se a morada da mobília
Mas não se perdem os laços de família
Laços de sangue não se perdem nunca.

LETRA PARA UM FADO

É uma história bizarra
História triste a da Julinha
Se for cantada à guitarra
Faz chorar toda a gentinha.

Vivia para Sacavém
Aquela de quem vos falo
Com um sobrinho e irmão
Só vê-la era um regalo

Fazia lindas flores
De plástico garridas
Das mais variadas cores
Girassóis e margaridas

Rosas, cravos, malmequeres
Tudo fazia com jeito
E ela própria entre as mulheres
Era mesmo um amor-perfeito.

Namorava com paixão
Um rapaz extraordinário
Quisera lá um bom operário
O Chiquinho do balcão

Mas um dia a tentação
Lançou-lhe a maldita garra
E a sua vida desde então
É uma história bizarra

Disseram-lhe que o namorado
Andava pela noite fora
Na boa vida no mau fado
E a pobrezinha coitada

Olhos e peitos em brasa
Sai uma noite de casa
E vai em procura dele.

Corre as más sempre à toa
Desde Alfama à Mouraria
Bairro Alto e Madragoa
Até à Praça da Alegria.

Andava de lés a lés
Pomba sem fel e malícia
Mas dá nas vistas da policia
E é levada pró xadrez.

E na Praça da Alegria
Praça da tristeza agora
A rapariga foi presa
E de inocente até chora.

Bem segura mas chorosa
Vai pró Governo Civil
Para provar a pobrezinha
Tal história triste a da Julinha.


Padre José Correia da Cunha





















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