sexta-feira, 7 de setembro de 2018

PE. CORREIA DA CUNHA - ACÇÃO CATÓLICA V










O NOSSO DESTINO É ELEVAR-NOS À 

PLENITUDE…




A importância de resgatar estas lições do Padre Correia da Cunha, aos jovens da JEC da Acção Católica, reside no facto de estes textos dos anos quarenta do século passado, manterem ainda um valor histórico e uma tremenda actualidade.

A vida não é apenas respirar. A vida é tudo o que existe dentro do mundo em que Deus nos colocou. A vida é o desenvolvimento de ideias e atitudes geradoras de sentimentos cuja ribalta deve ser o próprio corpo místico a que pertencemos. Pela razão e liberdade, a vida é tudo o que somos diante de nós mesmos. Muitas vezes ouvi ao Padre Correia da Cunha que a sua missão era viver e deixar viver… não queria que fossemos anjinhos. Os fracassos e os desânimos fazem parte da vida e o mais importante era continuar a resistir. O Reino de Deus é para os resilientes. Foste posto de lado? Tropeçaste? Não vos preocupeis com o ridículo nem com a derrota. Erguei-vos! O mundo pertence aos enérgicos e aos ousados e advém da graça divina depositada nas nossas almas. 

Não sei porque, mas após a leitura desta lição do Padre Correia da Cunha, sinto-me com a alma escancarada. Às vezes a nossa imaginação irrita-se com as verdades realistas dos humanos, obstinadamente empurrando-nos para os dramas de cada dia ou a querermos inventar pensamentos que amenizem todas as tragédias que se debruçam sobre o mundo no quotidiano.

Quanto mais pensamos que pensamos, menos pensamos, e mais distantes ficamos das ideias Divinas e da Graça que existe em cada um de nós baptizados. Destruímos ilusões, construímos sonhos falsos esquecendo-nos que o nosso destino é elevar-nos à plenitude. Deus na sua infinita sabedoria criou o universo com indiscutível perfeição e dá-nos a liberdade de o desorganizarmos através do pecado (Santa liberdade dos filhos de Deus). 

A vida à qual damos muito valor, nada vale dentro do tempo, pois ela finda-se e seremos miseras marionetas na vontade absoluta do destino de filhos de Deus, que é elevar-nos à plenitude.




Lição 5

Não se deve perder de vista que um cristão não é uma abstracção, como na prática, por vezes se julga. 

O cristão é antes de mais nada um ser de carne e osso como diz o Espírito Santo: «pueri communicaverunt carni, et sanguini, et ipse similiter participavit eisdem…»

O cristão é, pois, um ser de carne e osso resgatado pelo preço infinito do Sangue de Cristo: «imptoris pretio magno», que associado a uma vida e unido intimamente ao seu Corpo Místico é destinado a viver na terra como filho de Deus: «consors Divinae naturae». Numa palavra o cristão é um homem elevado ao estado sobrenatural, nem desencarnado, nem fora da terra. 

Desencarnado isto é: sem o seu corpo, sem a sua carne de pecado, sê-lo-á somente no dia em que o magno problema do seu eterno destino for para ele, definitivamente resolvido. Até lá porém, enquanto precisamente ele está na sua carne neste mundo, como pessoa ultra concreta, com a sua alma informando seu corpo e este por vezes pesando demasiado sobre a sua alma, deve o cristão assegurar esse destino de perspectivas infinitas… 

Um cristão não é um anjo, tampouco um santo embora seja este o tipo completo do cristão. 

Querer fazer de nossos dirigidos anjos seria um erro grosseiro e extremamente perigoso. O cristão não pode ignorar nem o sofrimento nem a tentação. Filho de Deus na carne, não somente como Deus «sinilitudinem carnis peccati», o cristão não pode viver fora do seu próprio corpo. Muito menos ainda fora deste mundo em que Deus o colocou. Enquanto, porém, estiver «in via» é um ser profundamente filho da terra a que está preso (quando mais atolado, por felicidade na sua lama). O mundo sensível que lhe opera sobre os sentidos, o mundo de que depende na sua actividade e no seu desenvolvimento, o mundo sociedade: a família, a profissão, a cidade ou povoação, exerce quer o cristão queira, quer não sobre ele um contacto imperioso e necessário quando não chega a ser uma influência real. Mas ainda que o mundo seja mau, lembremo-nos sempre da parábola do joio: «sinite atraque crescere usque ad messem» e das palavras de Nosso Senhor: «non rogo ut tollas eos de mundo sed ut serves eos ex malo…»


Resumindo: O cristão é o homem que em todas as suas circunstâncias de país, idade, temperamento e meio não desencarnado, nem longe do mundo, vive, como filho de Deus, a sua vida divina, procurando reproduzi-la em si e a seu modo o Cristo, Filho Unigénito de Deus, a cujo corpo Místico pertence. 

Viver não é ter simplesmente a existência, como uma pedra, ou qualquer ou qualquer outro ser inerte. A vida está em agir, a vida está no movimento «ob intrínseco» como dizem os filósofos. Todo o ser vivo tem em si o princípio da sua actividade. Vive porque e na medida em que utilizar a sua energia para crescer, desenvolver-se, adquirir novas perfeições e realizar possibilidades que em si se encontram. Com muito maior razão e em todo o vigor da expressão isto se pode dizer do homem, ser dotado de razão, consciente e capaz de se induzir. Dotado de liberdade se move como para onde e quando quer.

A vida da graça embora sobrenatural, deve, como vida que é, corresponder a esta definição. Se foi depositada na nossa alma, no Santo Sacramento do Baptismo, não foi para permanecer na inércia de uma real nulidade, mas, muito ao contrário para crescer e frutificar abundamente para Glória de Deus. Posta em nós sem a nossa cooperação (pelo menos quando se trata de pessoas baptizadas em criança) a vida divina não pode crescer, nem tampouco permanecer em nós, uma vez chegados ao uso da razão e por conseguinte capazes de regular a nossa actividade humana sobrenaturalizada, sem a nossa cooperação. Certos sempre do concurso indispensável de Deus e da sua graça, somos no entanto nós que agimos e nos determinamos livremente.




A nossa vida cristã supõe, portanto, da nossa parte uma actividade consciente e livre. Por isso mesmo que o nosso agir é consciente e livre somos muitas vezes, para não dizer continuamente obrigados a decidirmos-nos a escolha de dois bens o que julgamos mais nos convém. Na verdade o Divino Bem não nos apareceu ainda em toda a plenitude, e perante os bens parciais que nos solicitam pode a nossa vontade hesitar, perante bens contraditórios que se lhe apresentam pode ficar sem saber ao que deve atender, enfim perante tantos meios que se oferecem para realizar o fim que se propôs a nossa vontade pode escolher.

Se isto é já uma verdade quando se diz da actividade humana ainda não transformada pela graça, quanto mais o não é falando-se da opção que um cristão, como tal tem de fazer quando se encontra em presença de dois planos de actividade. Cada um destes planos tem seus fins próximos e remotos, têm seus meios peculiares, por vezes numerosos, mais ou menos eficazes e úteis. 

E é assim que o homem, com tem a sua vida sobrenatural poe essa mesma lei da vida, tende para a expansão de todas as suas capacidades físicas, morais e afectivas – no que contribui para as da Glória de Deus. Mas, esta tendência de extensão harmoniosa de todas as suas faculdades, que em si é boa, nem é abstracção, deve ser guiada, não pelo instinto animal mas pela razão e fé.

Não espera uma vida mutilada ou insignificante, nem uma vida corporal desportista, nem uma vida de ansiedade ou perturbação perante dificuldades que é preciso vencer, nem uma vida intelectualista ou estóica que despreza as realidades da vida e se refugia na sua cobarde torre de marfim. O cristão trabalha por conseguir e espera o desenvolvimento harmonioso de todas as capacidades pessoais, sem esquecer que a desordem trazida pelo pecado original requer a prudência no uso das criaturas sobretudo do corpo que sendo nobilíssimo instrumento da alma deve ser orientado para a vida sobrenatural.

















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