quarta-feira, 26 de março de 2025

PE. CORREIA DA CUNHA - CRONISTA FERNANDO BASTOS SILVA






CRONICA DE FERNANDO BASTOS SILVA - Com o seu olhar de lince o cronista escreve sobre a sua fantasmagoria em relação a um grupo de jovens da comunidade paroquial de São vicente de Fora, dos inícios dos anos setenta do passado século. Este grupo de Jovens foi fundado pelo Padre Correia da Cunha. Era um pároco que pelo seu exemplo animava, pela sua energia de palavra dava coragem. Ainda hoje os jovens deste grupo de jovens reconhecem o muito que o Padre Correia da Cunha fez em prol da Juventude. Como é sabido o Padre Correia da Cunha para além de zeloso prior – acolhia e dispensava um especial afecto ao fluxo de milhares de mulheres e homens que se deslocavam da Beira Serra para a cidade- capital. Particular atenção lhe merecia a formação dos filhos dessa gente. São este adolescentes e jovens que constituíam o Grupo de Jovens OBJECTIVO e ainda hoje continuam a honrar a memória deste grande Mestre de Vida : CORREIA DA CUNHA.  Estas crónicas são um poderoso instrumento para despertar acerca da  existência do OBJECTIVO. Assim, publico  a crónica sobre o ultimo jantar natalício do GRUPO DE JOVENS OBJECTIVO, ocorrido a 14 de Dezembro passado, no Restaurante Corsega  de Benfica. Momentos que não são cercados pela nostalgia mas um acontecimento que aspira em procurar-se activamente a sobrevivência de um Grupo que considero possuir alguma mistificação. 


 ESTA É A CRÓNICA QUE FAÇO DO ENCONTRO DO           

                   INCOMPARÁVEL GRUPO DE JOVENS «OBJECTIVO»

        

O sentimento de complexidade reclama, naturalmente, vários pressupostos de natureza causal, sem deixara de levar em conta a perspectiva finalística.  Não nos move a conceptualização inerente às celebradas Cinco Vias de  S. Tomás de Aquino, nem vamos inserir a situação ou  as situações num quadro mental de teorização da Evolução Quântica que nos iria permitir especular sobre a razão de andarmos a divagar meio perdidos por este nosso Mundo. Todavia, grato será refletir sobre os dois movimentos inerentes à nossa realidade que nos determinou a congregarmo-nos no local que o nome tem, de Restaurante Córcega, em Lisboa, lá para as bandas de Benfica, paredes meias com a densa mata do mesmo nome. I$E  E isto

Estamos, pois, perante o acontecimento ocorrido na memorável data de 14 de Dezembro de 2024.

-E não havemos nós de recriar os passos previamente dados para a sua concretização?...

Não nos custa muito imaginar:-Vamos então supor que inspirados ou “instados” pela afabilidade do querido Amigo Ismael, terão alguns ouvido a sua Mensagem:-”Marchai, caminhai por Lisboa, pelas suas sinuosas vias, até encontrardes um  Cenáculo  adequado”. E direis ao estalajadeiro que o Grupo dos Jovens, dos anos sessenta do século passado, ou seja aqueles que tomaram o “elixir da eterna Juventude”, querem, no 14 de Dezembro vir aqui celebrar a sua “Ceia”, a “Ceia”  que sela o indestrutível laço de Amizade que os enleia. Tal Grupo é composto por vários “Discípulos” que se compreendem nos originais e nos outros e outras que, entretanto, foram sendo acolhidos.

E tivemos a Notícia difundida Urbi et Orbi  que  nos deu conta da referida data e do elenco da vitualhas…De tudo se encarregaram, com subido esmero e competência  os “jovens “ Isidro e João Paulo.  esmero e

E lembramos o que está escrito e que sublima a refeição: Cantados os hinos, o Mestre cingiu os rins, fez as  rituais abluções e proclamou a sublimidade do Amor Fraterno.

Ora, naquela tarde, “juntos nos partimos” da nossa casa que no Altos dos Moinhos está assentada...”

Lembramos o Glorioso Poema que de Lusíadas tem o título  que nos situa no Espaço Europeu,  descrito o canto III. Ali se diz que “Entre a zona que o Cancro senhoreia/…..Jaz soberba a Europa,a quem rodeia,/...Pela Austral, o Mar Mediterrâneo.…

E continua:

Eis aqui, quase cume da cabeça/De Europa toda, o Reino Lusitano/onde a Terra se acaba e o mar começa ...esta a ditosa pátria minha amada….”

Tínhamos deambulado entretanto, num quadro de reconstituição, à “posteriori”  por uma certa Lisboa, na na sua configuração medieval e vale a pena citar o sábio que diz: we have stone age emotions, medieval institutions…

-Vá lá ver, diz-me a “alma minha gentil”...não te ponhas para aí com erudições que ainda acabas por ficar cá na Terra descontente….

-Mas diz-me lá: que não gostarias de integrar uma procissão desde S. Domingos até à Sé e sentir a limpeza que se opera na alma, na Abertura da Porta Santa, no Ano Jubilar?

E la fomos.

Ora a verdade é que a Sé abarrotava e a multidão que se apinhava à porta principal era grande…

E descortinando ao “redol”, vimos o exterior da Sé com  a sua estrutura de sólidas paredes, fendidas com estreitas ”seteiras” que, em caso de assalto por parte dos infiéis, os “increos”, deixavam passar uma furiosa chuva de envenenadas flechas com que estes eram trespassados, o “que haveria de ser boa cousa de veer

Mas não só isso, porque alí próximo, inscrito em negra ardósia” pregada na esquina de grosso muro “medievalesco” se identificava  o “Beco do Quebra Costas”. Ora tal Beco desenvolvia-se em escadaria de pedras, de vivas frestas...E assim, uma vez filado, o increo/malfeitor e inimigo de Cristo, atado de pés e mãos era arrastado escada abaixo e além dos osso esmigalhados e dos “focinhos lavados em sangue”, dali era retirado, esperando, na  fermentação de negro entulho, o  estridente soar da Trombeta a anunciar a ressurreição dos mortos.

- Ó mulher da minha alma olha...vê...lê o que naquela placa de pedra circundada de marmóreos e rosados floreados se inscreve: O SS PIO VI A INSTANCIA DA RAINHA D. MARIA I N. S. CONCEDEO INDULGENCIA PLENARIA TODA A PESSOA QVE CONFESSADA E COMVNGADA VIZITAR ESTA REAL CAZA E IGREJA DO GLORIOSO S. ANTONIO EM QVALQVER DIA DO ANNO….

E vemos ainda o que está escrito em incrustações de rija e matizada pedra onde se lê que o mui alto e poderozo Rey D João II deste nome mandou em seu testam…to  passar esta capela para santo António…..dando cvmprimento ao desígnio do poderoso Rey D. Manuel 1º deste nome;elle mandou fazer… etc.

-O senhora minha, dona do meu afecto, olha e medita na génese desta igreja de Santo António, onde o Papa se ajoelhou...

 


E continuando o nosso percurso fomos vendo umas fracções da grossa da muralha Fernandina (El rey D. Fernando deste nome a mandou fazer…)

E ainda espreitamos, de relance, as ruínas do Teatro Romano, sobranceiro ao  Castelo.

Deste Castelo, por onde deambulou o grande Damião de Góis, “escorrem “ umas vielas e outras estruturas de “segurança” que  o autor de  A History of Water de seu nome Edward Wilson-Lee relata com grande vivacidade referindo-se à agitada vida de Camões e que recorda o célebre episódio do dia da festa do Corpo de Deus a 16 de Junho de 1522 que propiciou ao  nosso Épico um encontro pouco amistoso com o cortesão de nome Borges, o que lhe valeu o cárcere num local onde a Saudade imperava, pois que “erros meus, má fortuna amor ardente/ em minha perdição se conjuraram…”

Uma colina a Nascente...uma colina a Poente e eis que se nos esboça a delimitação do Pátio do Tronco que ainda hoje arrepia visitar...E Camões sonhava, aconchegado na Eneida que trazia no coração...pois sabia-a toda de cor...ação.

E foi-lhe propiciada clemência, mas na condição de partir… de embarcar. E assim aconteceu e pode percorrer, navegando, aqueles mundos cujo caminho se abre logo no canto Primeiro onde se diz “já no largo Oceano navegavam/As inquietas ondas apartando para no Canto VII proclamar: E, se mais mundos houvera lá chegara”.

Pode ainda, roto e faminto, mas sobraçando o manuscrito do seu (nosso, depois) Poema, apanhar boleia a partir de Moçambique regressar Pátria. E é bom recordar a desgraça consequente aos descobrimentos, superiormente configurada em jeito de Profecia postecipada do Velho  do Restelo…Ó glória de mandar, ó vã cobiça/desta vaidade a quem chamamos Fama... (IV 95)

Veio depois o Templo dos Jerónimos e mai-lo CCB que testemunham  o grande ou talvez os “grandes “ (a títulos diversos) de Portugal…

 


Enfim, vale a pena lembrar este Pátrio Torrão onde, naqueles tempos do sec. XVI, cousas raras se iam passando...nomeadamente o desembarque e invasão de nativos/cativos. Estes exibiam a tez queimada...e isto graças ao erro da rota Rota do carro dc Faetonte.

E estas almas tantas preocupações de segurança causavam a ponte de serem encostados à parede, sentindo a aguda lança dos soldados a arranhar-lhes as costas-Vide Zurara e Diogo de Couto.

 E por falar em questões de segurança e sua ancestral herança, ainda hoje é visível o confinamento das claques de futebol que, “encarceradas em gaiolas”   lhes é permitida, debaixo de vigilância, toda a espécie de urros.

 

Enfim, coisas de Lisboa medieval onde os acontecimentos que traduziam acirrada luta pelo poder por parte do Imperadores, reis, duques, condes, biscondes, papas, bispos e  cónegos.                

Prosseguimos o nosso caminho, pelas serpenteadas ruas de Benfica, à medida que Hermes (deus mensageiro) nos guiava. Abriu-se, pois,  sob os nossos olhos o local do desejado encontro. E foi um circunstante que nos indicou  a “estalagem”, ou seja , o referido “Córccga”  onde a mesa ornada com as deliciosas vitualhas se nos iria apresentar...Ia ser, quem sabe, como  na representação do  Auto da Alma de Gil Vicente.

Arrumada que foi a “Charrete” tivemos ocasião de sondar a atmosfera em homenagem ao sr. D. Miguel a lambuzar-se à ceia em molho  de escabeche, para esquecer ao agravos que contra ele a Pátria cometia.

Rezam as crónicas que enquanto da sua real barba hirsuta a gordura  escorria, mas não deixava de pôr o braço de fora da janela para se deliciar com a leve brisa que se fazia sentir- Vide A Brasileira de Prazins de Camilo Castelo Branco.

E assim foi...e a “Alma Minha Gentil” e eu ingressamos .

E ocorreu o que de algum modo adivinhávamos e, sobretudo, desejávamos: Um caloroso acolhimento!...E  surge o Jovem Ismael  com o seu rosto que se abre no sorriso jovial que o brilho do seu olhar transmite.

-Que bom querido amigo: você é um “monumento” à eterna juventude.

-Não digam isso, não falem assim, olhem que já cá pesam uma razoáveis décadas.

- Pois sim ….mas olhe que, no que me diz respeito, o  cavername das minhas costelas range por todos os lados e até faz lembrar uma nau na tempestade de Os Lusíadas .

 

Depois o Rui Aço de largo e acolhedor gesto e com o sorriso que nos  transporta à Gioconda, embora a gente aprecie nas suas obras uma certa relação com Chagal ou Klimt...ou, melhor dito, com ele próprio, nos seus conquistados traço e estilo.

Acolhedores foram o Carlos Pereira e a Maria cujo enlenvo de comunicação é por demais evidente e com quem se conta para  criteriosa selecção dos âmbares.

Quem pode deixar de referir, o  João Paulo e Isidro, os  homem dos contacto e do expediente e que acabam por ser o emissáriom a que atrás se faz referência e que se desdobram em contactos par que tudo isto seja possível.

Estávamos nós entregues a estes devaneios preliminares, enquanto o grupo se ia  compondo, eis que deu sinal o arquitriclínico anunciando que a ágape ia ter início.



 

 ….


E o convívio prossegue com visível vivacidade...E como são recordados os antigos  tempos, os  tempos em que “jovens” sonhavam e imprimiam à sua vivência  do Grupo, o quadro humano e ao  mesmo tempo estético que faz com que hoje  seja incontornável a sua congregação…Afinal a realização, por via do afeto, é sem dúvida a dimensão mais  fulgurante que nos faz olhar para o nossos filhos e netos e também para os amigos repetir com Stephen Hawking : We have  this one life to appreciate the grand design of the universe, an for that I am extremely grateful.

 

Já nos entregávamos a soboreara a nossa refeição quando o “meu anjo protetor” me disperta para a oportunidade de tomar os medicamentos da praxe ...mas sem esquecer a “água suficiente”...Mas...mas a água faltava...Porém, à minha frente sentava-se a jovem Maria de Jesus...Foi  providencial: eu pedi-lhe um pouco da sua água…água esta que ao interagir com os medicamentos a tomar, me iria fortalecer quase regenerar .

Ora, veio-me à mente, o que se passou junto ao poço de Jacob  e que resta escrito:  Jesus pediu à mulher de Samaria:  “Dá-me de beber”. Ora,  diz ela, “como é que tu sendo judeu me pede de beber a mim que sou  Samaritana?

Ou seja: como é que sendo eu um alienígena do “grupo de Jovens”  me atrevia a um gesto destes?  E foi cousa boa de ver!

E o convívio mantinha-se animado e a comunicação era densa e intensa, porque motivado por um acentuado e partilhado sentimento de amizade. E não deixamos de comentar a atualidade nacional e mundial, mesmo correndo o risco de contrairmos alguma entorse mental ao debruçarmo-nos sobre as coisa da política...A mundial e a outra.

Ora é verdade que dada a minha condição de alienígena do Grupo não tenho nos meus ADN gravados os nomes de todos os participantes. Mas o sentimento de bem-estar e acolhimentos eram totais e com que simpatia e contagiante afeto revivo este pequena comunidade de calorosa amizade de que acabo por fazer parte.

E nosso convívio atinge o seu termo  com as juras de que haveremos de voltar a encontra-nos.

Este o meu testemunho do acolhimento caloroso que no Grupo de Jovens tem a sua particular e apreciável expressão, sendo que é quase impossível não sair sem uma atitude de simpatia quase estética por parte destes Amigos. 

Fernando Bastos Silva







domingo, 7 de janeiro de 2024

ALA DOS AMIGOS DO PADRE CORREIA DA CUNHA


amigos que já partiram...

IN MEMORIAM
AUSENDA RODRIGUES SOARES

1931-2023


Passa hoje um ano sobre o falecimento de AUSENDA RODRIGUES SOARES (1931-2023). Sempre apreciei as criaturas humildes, francas, sinceras, bondosas e imbuídos de energia contagiante. Eram estes os tributos desta benemérita paroquiana da Paróquia de São Vicente de Fora. Vivia para a sua Fé, família, paróquia e amigos.  Quero aqui exprimir a minha homenagem e a minha profunda e eterna gratidão a esta grande heroína. Soube há poucos dias,em conversa fraterna com o Vitor, que tinha falecido com as mãos no rosto do seu amado filho. Jamais se esquecerá aquele dia 7 de Janeiro de 2023, data da comemoração do 66º aniversário do seu filho. Morreu como viveu: Lembrando uma verdadeira Pietá, permitindo o momento do abraço sofrido entre Mãe e filho. Não têm mérito algum, estas singelas palavras, de alguém que deseja debruar uma homenagem póstuma, a uma verdadeira cristã que não media sacrifícios para cumprir a sua heroica missão. Era amada e respeitada por toda a comunidade, pela sua vida sempre pautada dentro dos princípios do amor a Deus e ao próximo. Foi filha, esposa, mãe e avó exemplar que deixa um rastro luminosos para todos que queiram seguir os seus passos que sempre foram de tornar mais felizes os seus semelhantes. Conhecia a Srª D. Ausenda Soares, há mais de cinquenta anos, cujo o espírito, logo percebi, era de uma enorme generosidade. Frequentava diariamente a paróquia participando na eucaristia vespertina.  Recordo com infinita saudade a forma carinhosa com que sempre me tratou, assim como o seu extremoso esposo Sr. António Soares com aquela fisionomia de discrição, bondade e tranquilidade. Nesta hora, cabe-me definir e conceituar a enorme   dedicação com que levava a cabo a tarefa de purificar todas as alvas, amitos, toalhas e artefactos utilizados na celebração da eucaristia. Era um trabalho divinal. Como referia o Padre Correia da Cunha: - Era difícil encontrar pessoa que manifestasse maior afecto e zelo à sua paróquia que AUSENDA SOARES. A sua vida foi realmente de uma entrega total, sempre encostada na simplicidade das suas atitudes, agindo em prol do bem-estar do seu clérigo, tendo cuidado da sua roupa e indumentárias durante décadas. Era de uma rara perfeição e cuidada destreza essa sua tarefa, que muito lhe devia a paróquia e o seu pastor, mas que ela procurava esconder nas sombras da sua modéstia, toda a grandeza do seu espírito superior. A sua vida física acabou, mas continua ainda mais viva espiritualmente do que nunca. Foi a repousar na Glória de Deus. Hoje junto do Pai continuará a interceder por todos nós que não queremos nem podemos esquecer a sua memória. São Vicente guarda-a em seu coração. Deixou a todos muitas saudades. Não posso deixar de publicar as doces palavras de um poema da autoria de Miguel Torga que seu filho Vítor Soares lhe dedica neste primeiro aniversário da sua morte. Nasceu 25 de Abril de 1931 - Faleceu 7 de Janeiro 2023.

 Mãe:

Que desgraça na vida aconteceu,

Que ficaste insensível e gelada?

Que todo o teu perfil se endureceu,

Numa linha severa e desenhada?

Como as estátuas, que são gente nossa

Cansada de palavras e ternura,

Assim, tu me pareces no teu leito.

Presença cinzelada em pedra dura,

Que não tem coração dentro do peito.

Chamo aos gritos por ti – não me respondes.

Beijo-te as mãos e o rosto – sinto frio.

Ou és outra, ou me enganas, ou te escondes

Por detrás do terror deste vazio.

Mãe

Abre os olhos ao menos, diz que sim!

Diz que me vês ainda que me queres.

Que nem a morte te afastou de mim!


domingo, 15 de maio de 2022

PE. CORREIA DA CUNHA – O RAPTO DA NOIVA

 





O CASAMENTO NÃO SE REALIZOU…



Havia na Rua de São Vicente um estabelecimento que muita gente não enxergava.
Não o viam pela aquela imensa agitação de sombras de vultos que o frequentavam e vibravam de ímpetos incoercíveis. Uma discreta placa, na ombreira da porta do prédio, anunciava uma ervanária, no 2º andar, para além da comercialização de ervas medicinais, constituía a justificação para outras actividades de caracter esotérico.

O oficiante era um jovem com formação superior, que após ter sofrido um violento acidente rodoviário, ficou paraplégico, vivendo ali na companhia da sua mãe pessoa de idade já avançada. Sem locomoção, sentado na sua cadeira de rodas, iniciou-se por meio de muita leitura de literatura e estudo profundo nessas áreas, tornando-se um conhecedor dos segredos de todas as plantas e através delas possuidor de poderes para lidar com o sobrenatural. Há época, era comentado por muitas pessoas do bairro, que naquele estabelecimento havia um homem de grandes virtudes, detentor de dons de feiticeiro, curandeiro, médium, parapsicólogo, bruxo… No edifício a atmosfera era de misticismo e secretismo. 

Muita gente ali se deslocava para procurar a constante resolução dos seus problemas de saúde física, conflitos com a vizinhança, conflitos conjugais e até amorosos. O ervanário usava o seu autoproclamado dom que lhe rendia algum bom dinheiro, permitindo que vivesse ele e a mãe com bastante conforto. Havia nas imediações uma jovem donzela, bonita, elegante que levava uma vida austera de trabalho. Era tímida e muito reservada. Nunca se lhe conheceu namorado. Só era vista diariamente nos seus passos sempre apressados de casa para o trabalho e vice-versa. Era funcionária nas OGFE (Casão). Vivia um mundo à parte dos demais. Aos domingos frequentava a sua paróquia, onde assistia à missa e rezava concentrada na pureza da sua fé. Da história familiar não tive tempo de saber muito, apenas que se tratava de uma família humilde e que a jovem era muito apegada à sua mãe. Soube mais tarde que a sua mãe e tia frequentavam consultas na ervanária. A mãe da jovem carregava consigo um grande sofrimento e um doloroso sentimento de culpa por haver negligenciado que aquele ser humano, não se tivesse desagarrado de si (era uma pera pronta a morrer na pereira), pois o tempo corria velozmente e não via na filha qualquer sedução de buscar um caminho de Felicidade. O seu sonho de ser avó desvanecia-se, assim como os pensamentos deslumbrantes ruíam sem esperanças. Porque não levar a filha consigo a uma consulta com o fitoterapeuta, para que este a ajudasse a encontrar um novo universo e quem sabe um príncipe encantado?

Avançou na ideia. Num final de dia entrou no gabinete acompanhada da sua filha, quando a luz do sol produzia uma ilusão subtil e serena. Uma luz calma que confortava a alma dos que buscavam soluções para os seus problemas. Algo ali se passou ao fim de algumas consultas. A jovem revirou-se na cadeira onde estava sentada, recebendo uma convocação misteriosa. Estava enamorada daquele sujeito que precisava de cuidados e, acreditava que assim, seria amada com segurança e confiança, adaptando-se ao extremo, esquecendo-se de si mesma. Na mesma semana se transferiu da sua casa, para ficar junto do seu amado. Passados uns meses toda a documentação estava pronta para que se celebrasse o sacramento do matrimónio. Era uma servidora da mística, servindo aquilo que de mais belo havia no seu destino. A celebração do casamento teria de ser nas instalações da ervanária, devido ao facto de não poder haver possibilidade de deslocação por parte do noivo.

O padre Correia da Cunha, envergando a sua batina, à hora marcada ali chegou para a realização do sacramento, no domicílio. Acompanhava-o transportando a pasta contendo a sobrepeliz e a estola, assim como o livro de assentos de casamentos.

Por imperativo da lei, tratando-se de um acto publico, era obrigatório a abertura das portas, para todos os que quisessem assistir. Aquando da abertura das portas ocorre um sequestro relâmpago, protagonizado pelos familiares da noiva, raptando a e levando-a com eles aos prantos e gritos. Ainda hoje retenho na minha memória a imagem da sua tia alta, larga e farta de seios, aguardando o momento para retirar dali a sobrinha pela sua hercúlea força. Era uma cena imaginária. O casamento não se realizou e a jovem foi levada num automóvel com destino a Fátima. O noivo com toda a serenidade perante as circunstâncias assistidas, manifestava uma enorme segurança, alegria, felicidade e paz interior. Fazendo-me lembrar a expressão do grande escritor Napoleon Hill : ‘’Seja o que for que o demónio me traga, eu responderei com rectidão.’’ Também o padre Correia da Cunha não foi surpreendido, pois havia sido informado previamente para a eventualidade desta operação por parte dos familiares da noiva. Instalada numa unidade hoteleira no Santuário Mariano de Fátima a jovem durante mais de uma semana não comeu mais nada, nem nada mais bebeu…. Estava agressiva e nem no sono tinha tranquilidade. O seu corpo começava a apresentar debilidades. A situação de saúde manifestava sinais de perigo e descontrolo. A inocente jovem podia morrer, e quem assumiria a responsabilidade de não ter feito absolutamente nada pela sua vida? 

A dor e a angústia dos pais eram grandes, por verem a filha prisioneira naquela ervanária. A operação pensada para a salvarem do cativeiro não estava a correr bem. Alguém da família em um momento de lucidez, pediu silencio e afirmou: ‘Para alguém que já passou uns largos meses, por tanta coisa como ela, o melhor é respeitarmos a sua vontade’. No amanhecer do dia seguinte, seguindo este sábio conselho, regressou toda a família a Lisboa e entregaram a jovem ao seu noivo que a aguardava com toda a serenidade e coroa de felicidade. Ela nunca deixou de amar a sua família que visitava assiduamente, de gostar das suas colegas das OGFE, onde seguiu sempre trabalhando e dos conhecidos que continuava a cumprimentar respeitosamente. Mas não colocava nada acima da sua escolha de vida. Sempre acreditei na ilusão de sermos diferentes e quando não somos… Quando iniciei estudos sobre a obra do grande filosofo contemporâneo – Sri RAM – um dos pensadores que mais escreveu sobre Vida Interior, tomei consciência que a felicidade é Paz e Serenidade Humana. A pergunta é pertinente. Haverá vida interior em cada um de nós? Se houver também teremos diálogos interiores. Porque haverá em cada um de nós, a tendência para revolucionarmos o mundo exterior? Onde estará a nossa capacidade de responder aos nossos desequilíbrios emocionais…? Muitas vezes buscamos fora o que está dentro de nós! Nesta história haverá muitas coisas que nunca saberemos explicar, porque nunca a experimentamos. Seguindo o pensamento do filosofo: «O ser humano só tem uma qualidade que é a sua vida interior que deve estar em paz consigo próprio». Esta é a nossa marca humana e a imunidade da nossa consciência. Paz não é indolência. Vamos lá à história do ervanário. A vida da jovem, até ali, era o que tinham feito por ela. Ela não tinha Acção nem participação.

Naquele final de tarde, naquela cadeira, ela viu por si mesma, ouviu com os seus ouvidos e pensou com a sua cabeça… O que aquele homem viu era o seu padrão de mulher. Estava lucido e soube ler a sua vida interior, sabendo o que poderia acontecer. A sua essência e identidade ninguém lhe podia tirar. Ela seria a sua 'amante' e servidora. O comportamento da jovem foi humano: viu, gostou e quis, depois nas emoções deixou-se aprisionar. Ele não lhe roubou nada, apenas lhe servia rastros de paz e beleza e ela não desejava nada mais. Ela seria uma Deusa servindo a beleza. Era feliz em Liberdade, optando pelo amor de servir o belo, que lhe gerava segurança, simplicidade e profundeza de vida interior. Esta história ocorrida no Bairro de São Vicente de Fora, nos anos setenta, já vai bem longa, pelo que a terminarei afirmando: que quando temos uma palavra, uma ideia, um conceito e a percepção de uma experiência a nossa consciência nunca nos vai deixar perder das bases (valores, sabedoria e virtudes) e dificilmente podemos embarcar numa barca que nos pode levar pelos mares da eternidade. Mais tarde o casal realizou o seu sonho de casamento e pelas notícias que me chegavam foram muito felizes por muitos e longos anos. Ela veio ao mundo para deixar a sua marca de serviço e generosidade ao ser amado.









quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

PE. CORREIA DA CUNHA - NATAL 2021







GLÓRIA A DEUS NAS ALTURAS;  PAZ NA TERRA AOS HOMENS DE BOA VONTADE



Natal 2021! As divinais mensagens natalícias vão se espargindo pelo mundo das redes sociais, iluminando as almas obscurecidas pelo empecilho desta terrível pandemia, que teima em não nos deixar, provocando tanta desilusão e cansaço. As realidades das notícias só cavam incertezas nos dias que vão surgindo e falta de esperança no porvir.

Desde a minha infância estava acostumado a esperar a noite de Natal, no aconchego do lar  com a família toda reunida, entre cânticos religiosos natalícios, acreditando na bondade daquele menino pobre, nascido numa manjedoura em Belém. Em cada Natal também Ele nascia nos corações humanos. Nas torres das igrejas os sinos anunciavam o nascimento de Jesus, convidando o mundo cristão para participar na missa do galo, em louvor do Deus-Menino. Na minha paróquia de São Vicente de Fora, no final da celebração presidida pelo Padre Correia da Cunha, todos beijávamos o menino; o sonho tornava-se realidade. Muito felizes e alegres abraçávamo-nos fraternalmente. Ao som de melodias celestes aquele espaço decorado e iluminado pelas cintilantes luzinhas transformava-se num mundo de confraternização de beijos e abraços como numa atitude sentimental de solidariedade. Mais tarde, nos claustros do mosteiro era a festa da partilha dos doces tradicionais de natal (filhós, azevias, bolo-rei, sonhos, rabanadas, coscorões, broas...) acompanhados de chocolate quente. A comunidade paroquial confraternizava num amplexo solene, iluminando a almas de todos à volta do seu pastor. Todos acreditavamos na «Paz na Terra aos Homens de boa vontade». Como seria bom que o menino Jesus neste Natal repetisse no interior de cada ser humano a máxima da sua mensagem: '' Amai-vos uns aos outros...'' 

Em todas as noites de Natal há sempre a sublime riqueza dos nossos tempos de infância, onde não havia leis de confinamento... mas grandes abraços que envolviam as nossas almas na grandeza de uma pequena estrela. 

Uma vez mais a celebração do Natal de Jesus iluminará os anseios dos que têm fé. Nos nossos lares festivos e alegres, que ninguém se sinta só, com a reduzida presença de familiares e amigos. Em espírito estarão connosco e unidos nos mesmos sentimentos de fraternidade. O menino Jesus por certo abençoará as intenções verdadeiramente puras dos nossos desejos. Assim, unidos seremos mais fortes. Juntos venceremos esta pandemia. Que o Natal seja cheio de gratidão, saúde e alegria para todos. Os meus votos de Santo Natal para os amigos e familiares. 

UM SANTO NATAL!








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quinta-feira, 11 de novembro de 2021

PE. CORREIA DA CUNHA E OS MAGUSTOS

 


 




O SÃO MARTINHO...NÃO PODE FALTAR UM BOM MAGUSTO



São Martinho! Bela página cristã, recordando um salutar sentimento de partilha. No encontro com o mendigo, com a sua espada Martinho cortou o seu manto ao meio para o dividir com o pedinte. Desde esse momento, por esta época o tempo mantem-se soalheiro, designando-se verão de São Martinho.



Hoje este dia traz-me à memória os grandes magustos organizados pelo Padre Correia da Cunha, na paróquia de São Vicente de Fora, onde os sentimentos puros, aquelas singelas demostrações de fraternidade e aquelas sublimes provas de amizade congregavam toda a comunidade à volta da fogueira das castanhas.

Não faltavam as castanhas assadas, no forno da padaria do Senhor António Barata (1931-2021) que recentemente nos deixou. Aproveito para recordar este homem de uma postura e de um trato formidável. A sua preciosa colaboração nos magustos de São Martinho era de mestria e grande zelo pelas suas extraordinárias qualidades e virtudes. Sempre apreciei este homem franco, simples, amigo do trabalho e muito honesto. Era um ser humano verdadeiramente feliz porque é dotado dos melhores sentimentos cristãos. Nunca recusava um pedido do seu pároco e sempre manifestava a sua disponibilidade para colaborar na feitura do grandioso magusto da Paróquia. Eram uma larga quantidade de sacos de castanhas. Toda a família paroquial se reunia no pátio dos corvos, para degustar castanhas e regá-las com o vinho novo e jeropiga. Para o Padre Correia da Cunha esta tradição não podia deixar de se comemorar na sua paróquia, pois era também uma forma de homenagearmos os nossos antepassados…

Na época actual esquecemos de tudo o que somos para pretender sermos tudo o que jamais seremos… São Martinho apesar de ser quase indiferente dos contemporâneos, com as comunidades entregues a outras preocupações, haverá, ainda, por aí, quem se lembre de imitar as tradições herdadas deste clérigo. Provar a pinga no dia de São Martinho. Que saudade dos meus dezoito anos!



Hoje, olhando para aquela Igreja de São Vicente de Fora, apenas me traz recordações e saudades nos meus pensamentos retrospectivos que a fúria da actualidade não consegue afastar das minhas ideias.

São Martinho. Uma saudade a mais em meus sonhos para relembrar uma bela página cristã, assinalando uma efeméride na fogueira da minha fé.








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sexta-feira, 2 de abril de 2021

PE. CORREIA DA CUNHA – PASCHA NOSTRUM



A NOSSA PASCOA 
44º ANIVERSÁRIO
2 ABRIL 1977





Em tempo de tríduo pascal, não podia deixar de lembrar com saudade o Padre Correia da Cunha, no dia em que se retirou deste mundo. Foi precisamente há quarenta e quatro anos. (Nas. 26 de Setembro de 1917 e Faleceu 2 de Abril de 1977). Perpetuar a memória dos que pela sua inteligência, cultura foram úteis à comunidade é dever que se impõe.

Dar conhecimento aos presentes e aos vindouros das virtudes e acções que enobreceram os antepassados, para que lhes sirvam de ensinamentos e estímulo, representa benefício para os vivos e justiça para os que já abandonaram esta peregrinação terrena. Foi no dia 2 de Abril do ano de 1977, que o zeloso sacerdote, cujas as palavras de mestre durante anos se afirmaram nos púlpitos da marinhagem e dos vicentinos nos deixou. Ficaram muitos livros de Vida Espiritual.




Hoje, trago a publico um desses livros – PASCHA NOSTRUM – A NOSSA PÁSCOA. É este prestimoso trabalho, uma compendiosa obra que foca a Liturgia Pascal, na vida dos cristãos. Vem na hora própria como o Padre Correia da Cunha o escreve no prólogo: ’’. Nas tuas mãos deponho este livro. Não para o leres com espírito de curiosidade, mas para que, por ele, mais facilmente vivas o mistério central de toda a vida cristã – A PÁSCOA – Foi por isso que lhe dei o nome de PASCHA NOSTRUM.É uma das manifestações da vida da Igreja a que dela dimana como fonte primária e indispensável do verdadeiro espírito cristão: a liturgia. É triste e faz pena… Mas PASCHA MOSTRUM vai-te acompanhar durante estes dias…’’ 

Este livro da autoria do Padre Correia da Cunha foi escrito em linguagem despreocupada que não exclui a elegância da forma e pureza da língua, são conceitos informados por aquele sentido prático e realista que o caracterizaram sempre nos seus escritos litúrgicos, de que deixou imensa obra escrita. O Padre Correia da Cunha foi dos mais esclarecidos espíritos do seu tempo nesta área, considerado um grande latinista e cultor de humanidades. Este valioso livro que conservo em meu poder, representa incalculável valor. Escrito por um homem dotado de uma aguda inteligência e insaciável vontade de saber. Recordo que no cerimonial das suas exéquias ocorridas no Domingo de Ramos de 1977, o seu bom amigo Padre Moreira das Neves teve-o com cerimoniário de toda a celebração.

No espólio da Paróquia de São Vicente de Fora, devem estar sabe Deus, em que estado, imensa obra e manuscritos da autoria deste sacerdote, não seria difícil encontrar preciosidades que deveriam conhecer a luz do dia. A sua alma de rara delicadeza e fina sensibilidade, depurada nas suas persistentes maleitas, vibram nestas obras tão cheias de ternura e amizade.
















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terça-feira, 12 de janeiro de 2021

ALA DOS AMIGOS DE PE. CORREIA DA CUNHA

 



Os amigos que partiram...




IN MEMÓRIAM

ANTONIO FRANCISCO FIALHO PALMA

1936-2017



Veio do coração das vastas planícies do Alentejo, onde nasceu no dia 4 de Abril do ano de 1936, na bela vila da Vidigueira. Ali, foi baptizado com o nome de ANTÓNIO FRANCISCO FIALHO PALMA. 

Com apenas 16 anos começou a sua vida de lutas na grande cidade de Lisboa, como empregado de comércio, numa das mais requintadas e prestigiadas lojas de pronto a vestir que havia na baixa lisboeta. 

Sempre foi um excelente trabalhador e cumpridor dos seus deveres, encontrando naquele estabelecimento a sua realização profissional. No entanto, faltava-lhe algo mais. Foi no Patronato de Nuno Alvares Pereira, fundado pelo Monsenhor Francisco Esteves (1871-1959) no ano de 1905, onde eram acolhidos muitos jovens do bairro de Alfama e São Vicente, onde lhes proporcionava a prática desportiva, actividades teatrais, musicais, passeios culturais e religiosos, que o Fialho encontrou um forte espírito de camaradagem, que tanto o cativou. Foi nos finais dos anos cinquenta que este jovem pelo seu comportamento e sagacidade se integra na vida activa do Patronato de Nuno Alvares Pereira. 

É admirável a participação do Fialho naquela obra, com um temperamento obstinado, indomável e com forte energia do seu espirito, ali participava activa e diariamente, em todas as actividades desportivas, culturais e de lazer, após os seus afazeres profissionais. Foi durante muitos anos membro da direcção do Patronato, sediado nas Escolas Gerais. 

Com a chegada do Padre Correia da Cunha no ano de 1961, à Paróquia de São Vicente de Fora, trazendo uma lufada de renovação pastoral, o António Fialho sempre encontrou tempo para se envolver nessa nova dinâmica. O Padre Correia da Cunha sempre elogiou este jovem, pelas missões prestadas ao serviço da Comunidade Paroquial. Foi sempre muito afectuoso e leal para com o seu pároco adoptivo, pois à época o Fialho era residente na freguesia de Algés. 

O António Fialho conquistou na Paróquia de São Vicente de Fora grandes amizades, tornando-se numa figura inesquecível. Sempre que vinha à capital, nunca deixava de visitar o seu amigo Padre Correia da Cunha. 

No ano de 2015, em que se apresentou o livro da minha autoria: Correia da Cunha – Mestre de Vida, tive a necessidade de elaborar uma lista de nomes, de antigos membros da Comunidade Paroquial de São Vicente de Fora, para os convidar a estarem presentes naquele nobre evento. Curiosamente, não houve um só, dos antigos alunos e membros do Patronato de Nuno Alvares Pereira, que não me referisse o nome do António Fialho, como grande discípulo daquele que o livro visava homenagear. 

Nos finais dos anos setenta regressou à terra que o viu nascer, mas nunca deixou de todos os anos, ali acolher as velhas amizades da Paróquia de São Vicente de Fora (amigos do Patronato) num almoço de confraternização com os sabores alentejanos. 

Com muita perseverança, desenvolveu acção relevante no Clube Vasco da Gama da Vidigueira, como director da modalidade do Andebol. Esta colectividade, em reconhecimento do seu profícuo trabalho, tem-lhe promovido grandes homenagens. Não querem deixar de recordar o Fialho Palma, pelo imenso amor e carinho que sempre dedicou á sua terra-natal e clube. 

Foi no dia 21 de Novembro de 2017, ano das celebrações do centenário do nascimento do Padre Correia da Cunha, que o António Francisco Fialho Palma, após doença prolongada, nos deixou. A falta que todos sentimos da sua franca amizade, incentiva-me a lavrar estas singelas palavras em sua memória. 

Dai-lhe Senhor, o eterno descanso e brilhe para ele o esplendor da Luz Eterna. 

Paz à sua grande alma. 












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sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

PE. CORREIA DA CUNHA - FADISTA CARLOS DO CARMO (1939-2021)

 






CARLOS DO CARMO (1939-2021) - E SUA MENINA E MOÇA


Não sei como começar a escrever de algo que aconteceu há mais de 50 anos, num dos pátios, dos amplos claustros do Mosteiro de São Vicente de Fora, na cidade de Lisboa.

O fadista Carlos do Carmo a convite do seu grande amigo Padre Correia da Cunha foi cantar a São Vicente de Fora, com toda a sublimidade do fado. Lembro que ele sorria de felicidade radiante, diante de uma enorme plateia completa. Um homem sozinho, acompanhado apenas de um guitarrista e um viola. Cantava primorosamente, pois a sua voz era toda sentimento.

Creio que muitos nunca esquecerão aquela tarde do ano de 1970, como refere o meu bom amigo Carlos Pissarra que muito contribui para a realização daquele maravilhoso evento. O António Carlos Pissarra ficou tão entusiasmado com o êxito obtido, que tentou convencer o Padre Correia da Cunha a transformar aqueles claustros, revestidos de azulejos, numa permanente sala de fados.

Foi brilhante a interpretação do genial fadista, com as melodias extraídas dos acordes daquela guitarra e viola. Conquistou a simpatia e efusivos aplausos dos vicentinos. As almas encheram-se de profundas emoções. No fadista Carlos do Carmo até o próprio silêncio tinha sonoridade.

Os fados interpretados pela voz do Carlos do Carmo eram sentidos pela alma. A arte musical não tem propriedade; é de quem a admira, a entende e a pratica com voluptuosidade dos amantes apaixonados. Era o caso do reverendo Padre Correia da Cunha, que sempre lutou para transformar a sua paróquia num verdadeiro Centro Cultural (a sua sonhada Associação para a música organística). Obviamente, dando primazia às actividades pastorais e ao culto.

Jamais poderemos esquecer a figura deste fadista e as interpretações das cantigas à sua cidade de Lisboa, como ainda hoje recordamos as belas cartas de amor que o Padre Correia da Cunha escrevia à cidade onde nas, cera. Nas nossas almas ficarão impressos pedaços de melodias poéticas, musicando o sentimento existente nos sonhos do nosso amor a esta cidade feiticeira: LISBOA MENINA E MOÇA...

Carlos do Carmo morreu. Soube-o através das Tv's neste primeiro dia do ano de 2011. O seu nome ficará gravado para sempre na história da canção nacional.

Por isso escrevo esta singela homenagem de muita admiração a este grande Homem de bondade e cavalheirismo. Lisboa nunca o esquecerá!







Sei da verdadeira amizade do Padre Correia da Cunha com a Dona Lucília do Carmo. Era plena e cimentada em grandes virtudes, desenvolvida em mútua nobreza de caracteres. Nesta foto : O Padre Correia da Cunha está numa tertúlia com amigos, no Restaurante típico O FAIA, que era proprietária a Senhora Dona Lucília do Carmo.




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quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

PE.CORREIA DA CUNHA - O NOVO ANO

 





DESPERTAR SEMPRE PARA UM NOVO AMANHECER...


Mais uma vez, estamos a chegar ao fim de um ano, que muito mudou as nossas vidas. Termina triste e sem grande festa! Perdemos quase dez meses em experimentações novas, que nos roubaram os belos sorrisos, ocultos por máscaras e os calorosos abraços, que nos fazem morrer de saudades. O Padre Correia da Cunha adorava multiplicar os abraços de felicitações pelos seus amigos. As nossas vidas tornaram-se misteriosas e distantes, de tão súbitas e imprevisíveis colhidas que nos confinaram, retirando-nos a felicidade que nos era devida. Muitas coisas findaram; muitas esperanças, sonhos e muitas vidas de amigos se extinguiram pelo maldito vírus…mas continuam vivas nos nossos corações. Foi com o Padre Correia da Cunha que apreendi, que enquanto os que partirem estiverem vivos no nosso coração, a morte não nunca poderá triunfar. Lembro também um celebre escritor, que escolheu para o epitáfio da sua sepultura a seguinte mensagem: Eu não estou aqui! Então onde estaria?

- Nos corações daqueles que o amaram e que não o querem deixar esquecer. Neste dia também o meu pensamento recorda com saudade o grande mestre Correia da Cunha.

Surgem os primeiros gestos optimistas com a vacinação, mas

ninguém é vitorioso diante de uma incógnita. Não nos falta a confiança e a esperança!

No limiar do fim do ano, sempre evocamos vários acontecimentos que não desejamos esquecer. Deste ano de 2020, só me resta o nascimento da minha amorosa neta Maria. Para além da pandemia foi um ano de desencanto, por falsas promessas e cansado de esperar por uma cirurgia, em hospitais confinados e profissionais centrados num único foco: A Covid. Factores diversos levaram-me a uma dobrada cirurgia e a duas semanas em cama de hospital. Algo que seria simples. Felizmente venci mais esta dolorosa etapa da minha vida.

No dia em que celebro mais um aniversário (31 DEZ), muitos dirão: Parabéns por mais um ano de vida, esquecendo-se eles que será menos um ano. Um pouco de tempo mais vivido é um pouco menos de tempo a viver. Cada ano que passa é mais um pedaço de vida consumido. Para mim o ano que finda é uma página lida e amarrotada. É passado!

É pois, motivo de jubilo no dia que surgirá um novo ano, recordar o glorioso passado da paróquia de São Vicente de Fora, onde aprendia a despertar sempre para um novo amanhecer, em cada novo ano que nascia… nas mensagem do pároco Correia da Cunha.

 

Um ano que finda não é mais do que o princípio de um ano novo.

Brevemente os relógios anunciarão o Ano Novo, haverá no olhar de cada um de nós um novo horizonte de sonhos e ilusões… A felicidade irá espalhar-se nesse dia em saudações de Bom Ano Novo. Não faltarão os brindes e palavras de optimismo, confiança e esperança.

Tão cheia de mistérios é a vida, que de imprevistas e maravilhadas surpresas da ciência, que espero confiadamente que este Novo Ano possa trazer-nos a alegria, que pela nossa resistência e sacrifício, bem merecemos. Como seria bom e reconfortante termos sabido esperar. Abramos confiadamente os braços a este NOVO ANO.

Neste fraterno espírito a todos envio um caloroso abraço de felicitações para o Novo Ano.

Feliz Ano Novo para todos os meus familiares e amigos.












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quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

PE. CORREIA DA CUNHA - NATAL

 







ACHAREIS O MENINO ENVOLTO EM

 PANOS E DEITADO NUMA 

MANJEDOURA. (São Lucas, 2-12)


As horas vão-se aproximando uma a uma à grande celebração do Natal. E em cada um de nós vão nascendo sonhos de transparência e luz. Embora vivamos em tempos, que são de desilusões e angústias, de uma já longa e cansativa trajectória desta furiosa pandemia. É na sucessão de momentos festivos que todos vamos alimentando a jubilosa esperança…

A natividade de Jesus simboliza a luz e a luz sempre deverá ser representada pela imagem de um recém-nascido, o aprendi com o Padre Correia da Cunha. O menino Jesus é o exemplo da humildade e da fraternidade, lição sublime tantas vezes desprezada pela humanidade. Na comunidade paroquial de São Vicente de Fora, o Padre Correia da Cunha lembrava que o Natal estava ligado profundamente aquele estábulo de Belém onde nasceu Jesus.

No vestíbulo da igreja era construído todos os anos, um grandioso presépio que simbolizava o nascimento do Salvador.


Natal! Na transfiguração das horas, os momentos passam e a gente vê o céu mais perto e a terra toda iluminada pelo presépio santificado, que simboliza o nascimento do Salvador. Natal! As chamas dos círios, junto daquele presépio, brilhavam com mais intensidade, iluminando as nossas almas e lembrando-nos que aquele menino vinha ao mundo, trazendo uma mensagem de solidariedade humana.




Nos longos sermões o Padre Correia da Cunha lembrava: muitos de nós, onde incluía os clérigos, fazemos do nome de Jesus, credenciais para a hipocrisia e egoísmo das nossas atitudes. Mas felizmente ainda existem por aí criaturas de alma límpida, que seguem os ensinamentos do menino, e que saberão esperar com fé e resignação, pelo dia feliz da concretização de seus desejos

O Natal é a festa da família! Este ano os lares estarão mais tristes pela presença reduzida de familiares. Nesta noite bem-aventurada fluirá um pensamento de união, dos que não estando presentes fisicamente, ali estarão espiritualmente. As estrelas cintilantes dependuradas no pinheirinho tradicional, simbolizarão os que já partiram devido a este maléfico Covid 19. As bolas coloridas brilhantes são o sinal de todos os que gostaríamos de estar connosco nesta noite mágica. Em local de destaque no lar estará o presépio iluminado, com a imagem daquele menino que trouxe como mensagem: a igualdade de sentimentos humanos.

Natal! Dia consagrado a Jesus.

Os nossos desejos e optimismos vão na ânsia de que a sabedoria da ciência, nos ofereça com triunfo aquilo que tanto ardentemente esperamos. No começo do fim, só nos resta a esperança; nas trevas só se espera a luz.

O Natal de Jesus deve ser motivo para gerar renovadas emoções, no irresistível aceno espiritual para os mandamentos do príncipe da Paz. Sejamos sinceros para com o menino que nasceu pobre num curral de Belém.













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