quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

PE CORREIA DA CUNHA E O FADO

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"NÃO HÁ PINCÉIS QUE DESCREVAM AQUELE SOBERBO QUADRO."


As raízes do Pe. Correia da Cunha cresceram profundas na cidade de Lisboa, como sabemos era natural de Arroios. Desde a sua infância que adorava Lisboa, não só pelos seus espectaculares monumentos mas sobretudo pelas suas gentes humildes e simples. O Pe Correia falava-nos das cores, cheiros e aromas únicos desta cidade.

O fado era um dos tradicionais cartões de visita desta sua cidade – canção com origens desconhecidas, mas indiscutivelmente de cunho urbano.


Para o Padre Cunha, o fado não era apenas uma canção acompanhada à guitarra. Era um pouco da própria alma do povo português. O ‘’marinheiro’’ Correia da Cunha sentia a presença do mar nas palavras do fado. A saudade e o infortúnio estão muito presentes na vida dos marinheiros na hora da despedida.


O Padre Correia da Cunha era um frequentador dos recantos de fado em Alfama, entendendo o fado enquanto expressão de música popular característica de Lisboa. O fado era uma manifestação cultural, que ganhou espaço na literatura, adquirindo uma dimensão nova.





A voz do fado, em AMÁLIA RODRIGUES, era tão bela que lhe lembrava a harmonia dos anjos serenos e abençoados ainda que tristes.

VIVER em São Vicente de Fora, em paredes-meias com os bairros históricos de Lisboa - Alfama e Mouraria, convidava a calar muitas noites o ruído das conversas perante a surpreendente ordem: ‘’Silêncio, que se vai cantar o fado. ‘’


Conheço um local no coração de Alfama, onde o Padre Correia da Cunha ouvia o fado, com a sua grande companheira a guitarra portuguesa. Juntos, fado e guitarra, contam a essência de uma história simples ligada ao mar.

Era:

“O Cantinho do António”, onde António actuava para os clientes e amigos que o visitavam. Homem afável e simpático, era frequentemente visitado pelos fadistas que faziam questão de o abraçar e cantar no seu recinto.

O fado de António Santos foi lentamente desviando-se para um género único lisboeta, nostálgico e dolente, da balada coimbrã, numa presciente antecipação de um estilo que nos anos sessenta se tornaria importantíssimo.

Aproveito também para evocar, pelo dinamismo e entusiasmo na organização de NOITES DE FADO no adro da igreja de Santo Estêvão – Alfama, onde foi pároco, e onde o Padre. Correia da Cunha era sempre seu convidado, Padre António Emílio, recentemente falecido. A paróquia de São Vicente teve boas recordações deste seu bom amigo. O Homem e Padre, António Emílio estará sempre vivo nos nossos pensamentos.

O Padre Correia da Cunha ainda teve possibilidade de escutar o fado moderno que se iniciou nos anos 60 e teve o seu apogeu com Amália Rodrigues. Foi ela quem popularizou fados com letras de grandes poetas, como Luís de Camões, José Régio, Pedro Homem de Mello, Alexandre O'Neill, David Mourão Ferreira entre outros.

Passámos muitas noites em amena cavaqueira em casa do Padre Correia da Cunha, bebendo as nossas cervejinhas e escutando os sublimes fados de Amália Rodrigues. A voz de Amália transformava todo o ambiente, envolvia-nos a todos num estado de elevação e emoção indescritível.

O Padre Correia da Cunha era um grande fã de Amália Rodrigues e exprimia essa sua paixão na seguinte expressão: foi abençoada por Deus...

Mas recordo que quando regressava a sua casa pela madrugada adentro, o fado que trauteava era:









IGREJA DE SANTO ESTÊVÃO

Na igreja de Santo Estêvão
Junto ao cruzeiro do adro
Houve em tempos guitarradas;
Não há pincéis que descrevam
Aquele soberbo quadro
Dessas noites bem passadas

Mal que batiam trindades
Reunia a fadistagem
No adro da santa igreja
Fadistas, quantas saudades
Da velha camaradagem
Que já não há quem a veja

Santo Estêvão, padroeiro
Desse recanto de Alfama
Faz o milagre sagrado
Que voltem ao teu cruzeiro
Esses fadistas de fama
Que sabem cantar o fado

O fado é hoje em dia cantado nas "casas de fado" e com o acompanhamento tradicional. As melhores casas de fado encontram-se nos bairros típicos de Alfama,Mouraria,Bairro Alto e Madragoa. Mantém as características dos primórdios: o cantar com tristeza e com sentimento de mágoas passadas e presentes.

Aos parceiros do fado e das noitadas peço que enviem informação sobre essas noites bem passadas!



















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4 comentários:

  1. Desde menino, quando apenas conhecia os anjos, já escutava na telefonia a bela voz da Amália. A Minha mãe lavava a roupa no tanque, num saguão, de uma casa na freguesia de S. Vicente de Fora e cantava desconhecidas cantigas da Beira Serra.
    Fui crescendo e um dia, no início dos anos 60 do século passado, descobri por acaso os caminhos que me conduziram, durante muitos anos, à Igreja de S. Vicente de Fora.
    Tinha então onze anos!
    Meus pais com raízes Cristãs nunca foram, habituais frequentadores da Igreja, nem nos obrigaram a ir à missa.
    A luta pela vida era tremenda! Meus pais levantavam-se às 4 horas da manhã, apanhavam o eléctrico que os levava à Praça da Ribeira e lá se abasteciam de legumes com que governavam a vida no mercado de Santa Clara. Nesse tempo aquele mercado fervilhava de gente e os lugares eram disputados e bem pagos nos leilões do Município de Lisboa.
    Tudo isto para dizer que os meus queridos pais levantavam-se cedo e deitavam-se tarde. A vida era madrasta… mas já estavam habituados.
    - Antes carregar duas sacas de batata cruzadas à cabeça que andar com um molho de mato e passar fome!, dizia minha mãe.
    Recordo que trabalhavam duramente toda a semana e o único dia que restava para descansarem era o Domingo. Talvez aqui esteja a razão para não serem assíduos frequentadores da igreja.
    - Rogério! Estamos para aqui fechados em casa os dois! Dizia meu pai na semana passada e continuava.
    - Se não fosse o Santana Lopes a fechar o mercado de Santa Clara a tua mãe e eu, mesmo com os meus 86 anos, estaríamos bem melhor de saúde vendendo e convivendo no Mercado de Santa Clara.
    Volto aos meus onze anos.
    Frequentava eu, o Liceu Nacional de Gil Vicente, quando um dia entrei nos claustros daquele Mosteiro. Nesse tempo as portas estavam abertas e, tirando o Panteão da Casa de Bragança que tinha segurança, tudo aparentava um abandono.
    Foi assim que conheci S. Vicente de Fora.
    Foi assim que comecei a caminhar para lá, até que um dia, já não andava no Liceu mas na escola comercial, Deus colocou no meu caminho, o caminho, para frequentar e cumprir o ritual semanal de um Católico e comecei a ir à missa.
    Não me quero alongar, nem sequer tenho tempo para corrigir ou fixar este texto corrido ao sabor da saudade.
    Nesse dia, em que o Padre Cunha tomava posse como Pároco de S. Vicente de Fora, faltou, à última hora, um menino do coro! Recordo-me que o Padre Cunha fazia questão de ter doze! Doze eram os Apóstolos e ele só tinha 11. Logo ali apareceram rapazes pequenos que não serviam! Tudo tinha sido verdadeiramente programado, ensaiado: os mais pequenos à frente! Tudo em carreirinho em duas filas! – Túnicas novas, feitas à medida! Medida grande como tivesse sido feita de propósito para mim!
    Pois bem! Não é que fui pescado quando por ali andava perdido…
    Já não recordo o nome do meu antigo Professor de Religião e Moral do Gil Vicente, porém, ele reconheceu-me e sugeriu ao Padre Cunha que o Rogério, seu antigo aluno, podia substituir o 12 menino do coro.
    Vestiram-me uma túnica branca, cingiram-me com um cordão vermelho e em poucos minutos ali estava eu a caminho do Altar, lado a lado com o meu saudoso António Melo e Faro os últimos das duas filas.
    -Faz o que eu faço, dizia o Melo.
    E foi assim que tudo começou para mim! Foi a minha primeira missa e o único a não comungar… A história já vai longa e ainda a procissão vai no adro…
    A partir desse dia tornei-me um efectivo membro daquela comunidade, graças a Deus!
    A partir desse dia comecei a frequentar a catequese e fui catequista!
    A partir desse dia passei a escutar a Amália no gravador de fita, do bom padre Cunha!
    A partir desse dia comecei a escutar órgão no belo e extraordinário órgão de S. Vicente de Fora!
    A partir desse dia comecei a aperfeiçoar a minha formação moral e tudo graças a um Homem extraordinário – polémico, certamente, para muitos – Obrigado Padre José Correia da Cunha.
    Rogério Martins Simões

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  2. Anónimo3.2.09

    O Brasil descobre Portugal


    Há tempos não se via na mídia brasileira tamanho interesse em nossa pátria mãe.

    O Brasil de hoje se volta para descobrir todos os encantos e maravilhas de um povo destemido, corajoso, batalhador, uma cultura secular permeada de riquíssimos detalhes deliciosos e curiosos.
    Sua música, gastronomia, turismo, ciência, enfim, valores extremamente grandiosos para um grande país tão pequenino fisicamente.

    Fazemos agora o trajeto inverso de nossos descobridores e, com a mesma surpresa e encantamento, nos apaixonamos por este país e seu povo.

    No entanto, não é necessário atravessar o Atlântico para conhecer um pouco dessas maravilhas.
    Desde sempre a cultura portuguesa vive no meio de todos nós, ou por meio da influência que tiveram em nossos hábitos e costumes, ou pela sua própria atuação nestas terras distantes.

    O Fado - mais que um estilo musical, uma linguagem universal que fala de sentimento, de amor, de saudade. A representação da alma lusitana.
    O Folclore riquíssimo e vibrante, cheio de cores.

    Tudo isso vive no Brasil através de dezenas de artistas que bravamente, distante de suas pátrias, vivem a divulgar sua cultura.
    E uma de suas representantes mais consagradas é Adélia Pedrosa.
    Ainda menina veio para o Brasil e aqui se consagrou como uma das mais belas vozes da música portuguesa.

    Conheçam sua história e sua arte em uma pequena apresentação especialmente feita para vocês.
    Basta clicar em: Adélia Pedrosa - Fado no Brasil
    ou digitar em seu browse: http://adeliapedrosarelease2009.blogspot.com

    Tenho certeza que será uma bela descoberta!

    Grata pela atenção
    Cláudia Tulimoschi
    http://adeliapedrosa.blogspot.com

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  3. Não posso deixar de fazer este comentário sobre o Padre Cunha que me foi contado pela minha sogra que sempre viveu em S.Vicente de Fora.Não era para brincadeiras com os casamentos.Nas preparações matrimoniais lá ia dizendo.Não cheguem atrasados...Não cheguem atrasados Mas como sempre acontece as noivas chegavam...atrasadas.Avisa então um aviso à família (depois de muito agurdar).Espero mais cinco minutos!Como é óbvio a noiva não chegava nos cinco minutos estabelecidos.E finalmente quando chegava dizia com o seu temperamento:E agora já não os caso!A noiva chorava. Mas obviamente o Padre Cunha não deixou nunca de celebrar nenhum casamento.

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  4. Prezado Dr. Carlos Vieira

    Realmente as noivas tinham a péssima fama quanto ao respeito pela pontualidade. Padre Correia da Cunha ficava espantado e furioso com a falta de cuidado que as noivas tinham pelo cumprimento da hora da celebração. Mas, lembro-me de um belo domingo, Padre Correia da Cunha ter esperado até às 14,30H quando a Cerimónia estava marcada para as 13,00 H. Não estando presente a noiva, Padre Correia da Cunha retirou-se pela porta da frente e foi tranquilamente almoçar, tendo regressado pelas 17,00 H para realizar a Cerimónia.

    Lembro-me de ter presenciado os convidados irritados com a sua atitude … e de terem esgotado os stocks de sandes das pastelarias das redondezas, enquanto os noivos se mantiveram tranquilamente sentados durante duas horas aguardando o regresso do celebrante.

    Quando regressou lembro-me de ter referido:

    - Compreendo, como é difícil ser pontual num país de atrasados…
    Espero que no futuro haja mais respeito pelo tempo e pelo Prior.

    Espero que esta sua lição ajude a convencer os futuros ‘’atrasadinhos’’ …para o requisito da pontualidade.

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